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UE: Acesso ao poder é o que mais afasta da igualdade homens e mulheres

A desigualdade no acesso ao poder é o que mais afasta a União Europeia (UE) da plena paridade entre mulheres e homens, constata o Índice da Igualdade de Género, que é apresentado esta quinta-feira em Bruxelas.

© Créditos: Shutterstock

“O desequilíbrio na tomada de decisão persiste um desafio importante para a UE e para todos os Estados-membros”, aponta o Índice da Igualdade de Género (GEI, na sigla em inglês), ferramenta que pretende mostrar “onde estamos e para onde vamos” em matéria de igualdade de género.

“As mulheres estão claramente subrepresentadas nos cargos de topo da tomada de decisão na maioria dos Estados-membros”, apesar de representarem "quase metade da força de trabalho e mais de metade das diplomadas no ensino superior”, refere o primeiro relatório do GEI, a que a Lusa teve acesso.

É no poder que a UE apresenta piores resultados em matéria de equilíbrio entre mulheres e homens, com “a maioria dos Estados-membros abaixo” da média europeia. A política regional é exercida em “menos de um terço” por mulheres, taxa que desce mais nos parlamentos nacionais e nos ministérios governamentais.

Se o poder for económico, a situação piora, sobretudo nas administrações das maiores empresas.

A “muito baixa” proporção de mulheres em cargos de decisão revela “um desperdício de recursos humanos altamente qualificados”, constata o GEI, recomendando às instituições comunitárias – nomeadamente à Comissão Europeia – que adoptem medidas especificamente direccionadas para combater esta desigualdade.

Mulheres continuam a ganhar menos do que os homens

Outra das conclusões revela que, em 2010 (data das estatísticas trabalhadas no GEI), “as mulheres ganhavam menos do que os homens” nos 27, registando-se progressos “meticulosamente lentos”.

Em todos os Estados-membros, as mulheres “são desproporcionalmente responsáveis por cuidar de crianças, avós e outros dependentes, por cozinhar e por trabalhos domésticos”.

O tempo livre é utilizado de forma muito díspar por mulheres e homens, com estes a participarem mais regularmente em actividades desportivas, culturais ou de lazer.

Enquanto na saúde, não há muita diferença no atendimento das necessidades de mulheres e homens, é no conhecimento que o desequilíbrio começa claramente a perder terreno.

As mulheres já são a maioria no ensino superior, o que terá “implicações, a longo prazo, no mercado laboral, na economia e sociedade em geral”. Por outro lado, a segregação por áreas de estudo “mantém-se largamente inalterada” – os homens continuam sobre-representados em engenharia e construção e as mulheres em educação.

Por tudo isto, recomenda o GEI, “é crucial começar a pensar no que esta mudança nas tendências significará para o cenário da igualdade de género no futuro”.

A violência de género não é um dos seis domínios centrais do GEI, porque, neste caso, não se pretende a paridade, mas a erradicação.

Nove em cada dez vítimas de violência doméstica na UE são mulheres e estima-se que “um quarto tenha sofrido violência física pelo menos uma vez na vida adulta”, vinca o GEI.

No global, resume o GEI, “mais de 50 anos passados de políticas para a igualdade de género”, a UE "continua longe de atingir o objetivo” e os Estados-membros apresentam ainda variações significativas.

Portugal abaixo da média

Portugal está abaixo da média da União Europeia no Índice da Igualdade de Género, com melhor registo na saúde e pior no usufruto do tempo, segundo os resultados a apresentar hoje, em Bruxelas.

O primeiro relatório do Índice da Igualdade de Género (GEI, na sigla em inglês) – ferramenta elaborada por uma agência da Comissão Europeia que é lançada oficialmente hoje, numa conferência de alto nível, em Bruxelas, na presença do presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy – apresenta resultados para seis domínios: trabalho, dinheiro, poder, conhecimento, saúde e tempo.

A Suécia comanda a lista geral do GEI e também o resultado no domínio do poder. A Irlanda lidera na saúde, enquanto a Finlândia revela superior desempenho no trabalho e o Luxemburgo no dinheiro. A Dinamarca vai à frente no conhecimento e a Holanda no tempo.

Saúde, trabalho e dinheiro – são, por esta ordem, os três melhores resultados de Portugal no GEI, mas todos abaixo da média europeia.

Em entrevista à agência Lusa, na sede do Instituto Europeu para a Igualdade de Género (EIGE, na sigla em inglês), em Vilnius, Lígia Nóbrega, socióloga portuguesa que trabalhou na construção do GEI, confessou que alguns resultados de Portugal a surpreenderam.

Por exemplo, na saúde, pensava que o país estava “um bocadinho melhor”. Porém, reconheceu, ser este o melhor resultado “significa que o Estado Social ainda está a funcionar, pelo menos por enquanto”.

O GEI é “um instrumento estatístico”, que pretende indicar, para um determinado momento no tempo, “onde é que se está relativamente à questão da igualdade de género e em que domínios se está a progredir e a precisar de melhorar”, resumiu a perita portuguesa.

O índice “procura desmontar" a “realidade complexa” da igualdade entre mulheres e homens e traduzi-la "num numerozinho muito simples”, para “avaliar” a situação na UE e “comparar” o desempenho dos países-membros, explica.

“Já existiam índices mundiais de igualdade de género, mas a União Europeia ainda não tinha criado um”, recordou. O projeto do GEI - levado a cabo pelo EIGE, agência da Comissão Europeia - arrancou em 2010, enfrentando alguma “resistência” dos Estados-membros.

“Nem todos os Estados-membros estavam de acordo e agora, quando forem divulgados os resultados, vai ser complicado também”, previu Lígia Nóbrega, antecipando “muitas críticas” no plano político.

Mas isso não lhe "tira o sono": a metodologia e as fontes (sobretudo Eurostat, Eurofound e Direção Geral de Justiça da Comissão Europeia) “são perfeitamente validadas”.

No final, a portuguesa disse esperar que todos compreendam que o GEI “é um instrumento extremamente poderoso e valioso para poder orientar as políticas no sentido do progresso relativamente à igualdade de género”.

Os resultados do GEI – que se pretende actualizar “pelo menos a cada dois anos” – apontam os domínios para os quais as políticas devem dirigir-se.

“Não estamos a construir um instrumento estatístico só, puramente. Estamos a construir um instrumento que sirva de alguma coisa, que sirva efectivamente para melhorar a situação das pessoas”, frisou.

“Se a situação das cidadãs e dos cidadãos europeus não é a desejável, é importante que isso também seja refletido no índice”, considerou, constatando que não existem, na UE e nos Estados, estatísticas de género que facultem informação suficiente, comparável e harmonizada.