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Legislação

Saquetas de nicotina sem tabaco podem ser um problema no Luxemburgo

Muito populares entre os adolescentes, as bolsas de nicotina sem tabaco não estão sujeitas a nenhuma legislação no Luxemburgo.

© Créditos: Marc Wilmert

Laura Renée Francine BANNIER

As bolsas de nicotina sem tabaco chegaram ao mercado do Luxemburgo, em 2020, mas o seu uso tornou-se mais popular nos últimos meses. Por trás da aparência inofensiva do produto (por vezes apresentado erroneamente como substituto da nicotina), esconde-se um risco real de dependência, que o torna uma porta de entrada para o cigarro e derivações.

A saqueta de nicotina "é um produto que não se enquadra na lei do tabaco, pois não é aquecido nem inalado. Também não é um produto alimentício. Por isso, no Luxemburgo, não há regulamentação para estas saquetas", explica Pedro Marques, responsável pelo controlo do tabagismo na Direção-Geral da Saúde.

Essa questão legislativa permite que os fabricantes contornem todas as regulamentações que normalmente se aplicam aos produtos derivados do tabaco. "A publicidade desses produtos, assim como a sua distribuição, não é regulamentada. A indústria está a aproveitar para atingir os jovens com um marketing agressivo, o que significa que temos de estar realmente atentos", continua Pedro Marques.

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Perto das estações de serviço no Luxemburgo, as saquetas - que parecem pacotes de rebuçados - são distribuídas a clientes que vêm abastecer. No início de abril, a marca Velo, comercializada pela British American Tobacco (que também detém os cigarros Lucky Strike) foi uma das que aderiu a esta tática. Vale notar que a marca disponibiliza também no site oficial o envio de amostras gratuitas de vários produtos da sua gama.

Se a ação de distribuir gratuitamente não é proibida por lei, a forma como o produto foi apresentado ao consumidor levanta questões.

Sem provas

As amostras foram oferecidas aos transeuntes como substitutos da nicotina, o que o responsável pelo controlo do tabagismo da Saúde condena. "Estas pessoas não têm o direito de apresentar este produto nestes termos fora de uma farmácia", defende.

Não há prova da sua eficácia no contexto da cessação do tabagismo

A Fundação do Cancro adverte sobre a eficácia desses produtos como opções reais para parar de fumar. "As gomas e adesivos vendidos em farmácias têm eficácia comprovada cientificamente porque duplicam as hipóteses de parar de fumar. Para estas saquetas, tais estudos não existem. Não há prova da sua eficácia no contexto da cessação do tabagismo", afirma Lisa Noesen, profissional de saúde da Fundação.

Um ponto de vista partilhado por Pedro Marques. "As saquetas são apenas nicotina. A pessoa não está a lutar contra nada, exceto o gesto de segurar o cigarro na mão".

Mas adianta que, "com o programa de cessação tabágica que criado com o CNS, os doentes beneficiam quer de adesivos, pastilhas e outros medicamentos para deixar de fumar, quer do apoio de profissionais de saúde que vão ajudar a combater as duas vertentes da toxicodependência".

© Créditos: Marc Wilmert

Além de ineficaz no contexto da cessação do tabagismo, este produto pode representar riscos à saúde dos seus consumidores. "Se não é cancerígena em si, a molécula de nicotina não é isenta de perigo. Além do risco de dependência, existe o risco de intoxicação que resulta em náuseas, dores de cabeça e vómitos", continua o especialista.

Embora os primeiros sintomas possam aparecer já numa ingestão estimada de 21,25 miligramas para adultos, uma quantidade menor pode ser suficiente para causar envenenamento em crianças. Cada saqueta pode conter até 20 miligramas de nicotina.

Afinal, qual é a composição?

"O outro risco à saúde são os aromas usados. Não sabemos a composição exata dos produtos, pelo que podemos facilmente imaginar que existam aromas nocivos para a saúde que podem causar riscos de irritação das gengivas", alerta Pedro Marques.

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Por não estarem sujeitas a nenhuma legislação, as saquetas não são submetidas a nenhum teste e a sua composição não é conhecida pelo Ministério da Saúde. "Como os produtos não são regulamentados, pode haver 15 miligramas, como 3, numa saqueta que anuncia 10. Não garantimos que o nível que está escrito na embalagem corresponda ao que está dentro de embalagem, aumentando o risco de intoxicação", alerta Pedro Marques.

Rumo à legislação europeia?

Perante o receio relativo ao produto, a Fundação do Cancro é favorável à regulamentação e pede que esta seja semelhante à dos produtos do tabaco. "Embora estas embalagens não contenham tabaco, não são isentas de riscos e os jovens devem ser protegidos dessa substância altamente viciante. Quanto mais jovens somos, mais sensíveis somos a isso e os jovens terão dificuldade em livrarem-se desse vício. Esse tipo de distribuição gratuita deveria ser proibido, como é o caso dos produtos derivados do tabaco", defende Lisa Noesen.

Uma posição partilhada pelo Ministério da Saúde, que indica ter aberto o diálogo com os homólogos europeus desde a chegada das saquetas ao mercado. Enquanto alguns países, como a Holanda, já os proibiram, outros, como a Espanha, fizeram a opção temporária de regulá-la como produto farmacêutico.

"No Luxemburgo, as discussões estão em andamento. Estamos a estudar as possibilidades de fazer uma lei nacional, mas o desafio é definir claramente o produto para não haver lacunas e que a sua utilização seja bem regulamentada", confidencia Pedro Marques, que se diz a favor da coordenação com outros Estados-membros da UE através da alteração da Diretiva de Produtos de Tabaco da UE.

(Artigo original publicado no jornal Virgule. Adaptado para ao Contacto por Ana Patrícia Cardoso)