Contacto
LuxemburgoDívida à funerária

Mãe não consegue levar as cinzas do filho para o Brasil

Marly Mendonça não tem dinheiro para pagar a dívida de 4.200 euros à funerária. Enquanto não pagar não lhe entregam os restos mortais do seu filho, Jefferson Roque.

Marli Mendonça

Marli Mendonça © Créditos: Gerry Huberty

Jefferson Roque morreu num autocarro no Luxemburgo, segundo a polícia, na sequência de um ataque de epilepsia, há cerca de um mês. "A polícia diz que foi epilepsia, mas pode ter sido um enfarte ou um AVC", diz Marli Mendonça. A mãe ainda não sabe a verdadeira causa da morte porque o relatório da autópsia ainda não foi divulgado.

Tudo aconteceu a 21 de março. Filipe, de 39 anos, como habitualmente saiu de casa em Mondorf-les-Bains às 5h30 para ir trabalhar. Apanhou o autocarro e o incidente aconteceu já perto da Gare da capital. Tentaram reanimá-lo várias vezes. A polícia registou a morte passava pouco das 8h manhã, já no hospital.

Jefferson trabalhava no Luxemburgo há oito anos como costureiro e era conhecido como estilista como Filipe Haussman e estava legalizado por visto de trabalho.

Marli Mendonça, a mãe que vive no Brasil, só soube do sucedido ao final da tarde. A notícia foi-lhe dada pelo ex-companheiro do filho, Rafael Lopes Vieira. Rafael recorda que naquele dia a polícia bateu à porta de sua casa para lhe dar a triste notícia passava pouco das 19h da noite. A polícia recusou-se a ligar para a mãe e foi Rafael que teve que lhe contar da morte do seu filho.

Rafael Lopes Vieira

Rafael Lopes Vieira © Créditos: Gerry Huberty

A mãe sem dinheiro para pagar o bilhete de avião para vir ao Luxemburgo, só conseguiu viajar para o Grão-Ducado porque as comunidades brasileira e portuguesa no Luxemburgo fizeram uma recolha de fundos para custear o bilhete. "Todo o mundo fez uma vaquinha para que ela pudesse vir", conta Rafael que agradece a solidariedade dos brasileiros. Marli aterrou no dia 21 de abril no Luxemburgo, um mês depois da morte do filho. Mas mal sabia o que se iria passar. O pesadelo burocrático começou. Agora não consegue levar as cinzas do filho para o Brasil.

Tudo porque a funerária exige o pagamento de 4.270 euros para entregar as cinzas. Dinheiro que não tem. Recorreu ao Consulado do Brasil e ao serviço de assistência social luxemburguesa para pedir ajuda. Mas nada conseguiu. O Contacto questionou a Segurança Social e o Consulado mas não obteve qualquer resposta até ao momento.

"Fui na assistente social e apresentei o valor da cremação", refere Rafael. A única resposta que recebeu foi a proposta de fazer um empréstimo de 4.200 euros que depois teriam que ser pagos ao ritmo de 100 euros por mês. A mãe com um salário mensal no Brasil de 1.200 reais, o que corresponde a 300 euros, não tem meios para pagar este valor. "É impossível ela enviar 100 euros por mês", diz Rafael. Marli sente-se num beco sem saída. Tem viagem de regresso marcada para o dia 8 de maio e receia não conseguir levar as cinzas do filho. E assim cumprir a vontade dele de regressar à sua terra natal.

"Ela disse que não pode fazer mais nada", diz desesperado Rafael depois da conversa com a assistente social. "A única ajuda que poderemos ter é pagar os 4.270 euros e receber depois um reembolso de CNS de 1.164 euros que corresponderá às despesas médicas", acrescenta Rafael.

"O Jefferson já trabalhava aqui há oito anos, estava legal e descontava os seus impostos e agora não tem qualquer ajuda. O que achamos injusto, não só pela situação dele, mas imagine um estrangeiro que vem de África ou da China que está aqui sozinho e falece, a sua mãe estará todo o dia a mandar mensagem, ligando todos os dias, e depois passam semanas sem saber o que se passa e depois a pessoa é enterrada no cemitério comunitário aqui no Luxemburgo", salienta Rafael.

"Estamos revoltados e queremos divulgar o caso para que não aconteça com mais pessoas", conclui.

O caso está a mobilizar as comunidades brasileira e portuguesa no Luxemburgo. As organizações REVIBRA e Coletivo Entreajuda Luxemburgo estão a organizar uma rifa solidária para ajudar Marli. "Até agora já conseguimos 1600 euros" revela Dayana da Silva, coordenadora da REVIBRA no Grão-Ducado. Vão também escrever uma carta que será enviada às autoridades brasileiras e luxemburguesas pedindo para que seja criado um enquadramento legal que permita que seja dada ajuda nestas situações. Será também lançada uma campanha com um vídeo pedindo ajuda aos governos dos dois países.

Dayana da Silva

Dayana da Silva © Créditos: DR

O caso está a mobilizar as comunidades brasileira e portuguesa no Luxemburgo. As organizações REVIBRA e Coletivo Entreajuda Luxemburgo estão a organizar uma rifa solidária para ajudar Marli. "Até agora já conseguimos 1600 euros" revela Dayana da Silva, coordenadora da REVIBRA no Grão-Ducado. Vão também escrever uma carta que será enviada às autoridades brasileiras e luxemburguesas pedindo para que seja criado um enquadramento legal que permita que seja dada ajuda nestas situações. Será também lançada uma campanha com um vídeo pedindo ajuda aos governos dos dois países.

"A gente se sente impotente diante de uma situação como esta. O que mais gostaríamos é que a mãe chegasse aqui e pudesse levar as cinzas de volta para o Brasil", diz Dayana Silva. "Quando se procuram os serviços sociais e se descobre que não há forma de poderem ajudar é revoltante", acrescenta. "E não sabemos quantos brasileiros e estrangeiros de outras nacionalidades já passaram por isso", sublinha. "Atualmente um imigrante que trabalha toda a vida no Luxemburgo e morre não tem qualquer ajuda para regressar ao seu país. Se essa pessoa não tem ajuda é enterrada como indigente no cemitério comunitário, o que é inaceitável", conclui.