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Adolescentes do Luxemburgo com insónias e dificuldade em falar com os pais

Estes são apenas dois dos problemas dos jovens de 11, 13 e 15 anos do Luxemburgo revelados num relatório internacional. Há mais preocupações, mas também elogios. Especialistas explicam.

© Créditos: AFP

Como são os adolescentes do Luxemburgo, entre os 11 anos e os 15 anos? Em poucas palavras, são jovens sedentários, pensam que estão gordos demais, queixam-se de dores nas costas, sentem-se irritados e com dificuldade em dormir. A grande maioria usa preservativo nas suas relações sexuais, envolvem-se com frequência em conflitos físicos, e têm dificuldade em comunicar com os pais, sobretudo com o progenitor. Na escola, consideram não ter grande apoio dos professores.

Este retrato é feito através de grande estudo europeu, que inclui também o Canadá, o "Health Behaviour in School-Aged Children (HBSC) Survey in Europe and Canada 2017/2018", da Organização Mundial da Saúde (OMS) que apresenta os dados de 222.441 jovens, dos 11 anos, 13 e 15 anos, de 45 países e regiões da Europa, onde se inclui o Luxemburgo. Ao todo foram 9.738 adolescentes, alunos, do Grão-Ducado que participaram neste inquérito.

Um dos comportamentos em que os adolescentes de 15 anos do Luxemburgo são um exemplo para todos os jovens do relatório internacional é em relação ao uso do preservativo, em que o país ocupa o 3º lugar da tabela, atrás da Espanha e da Grécia, que lideram.

Neste relatório internacional que analisa a saúde e bem-estar dos adolescentes, um dos pontos comuns a todos os países é a influência que tem o rendimento da família, nos comportamentos do adolescente. Quanto maior for o rendimento, menos problemas os adolescentes têm, na generalidade. Um dos exemplos é o das queixas da saúde.

E na área da saúde, os jovens de 15 anos do Grão-Ducado são os que mais se queixam com dores nas costas, mais do que uma vez por semana, surgindo o país em 4º lugar na tabela geral. As queixas de dores de estômago também são mais frequentes do que a média dos outros países, bem como a dificuldade em dormir. O Luxemburgo surge em 10º lugar nos 11 anos de idade, e nos 13 anos, há 31% das raparigas e 30% dos rapazes que dizem ser difícil adormecer.

O sedentarismo também faz parte do dia a dia destes jovens, encontrando-se o Grão-Ducado nos últimos lugares do ranking geral, quanto à prática de exercício físico moderado.

Irritados e com dores nas costas

Irritados (25% das raparigas e 19% dos rapazes), nervosos (22% em ambos os sexos) e a sentirem-se fracos (20% raparigas e 13% rapazes) mais do que uma vez por semana, assim se confessam os adolescentes de 11 anos, do país, e em maior percentagem do que nas outras idades.

"Estou muito gorda", isto é, o que pensam as adolescentes de 11 anos, em relação à sua imagem corporal, e esta é uma percentagem alta que as coloca em 4º lugar na tabela geral. Mesmo assim, fomos o país com a descida mais significativa nesta questão, em relação ao relatório de 2014. Porque o relatório HBSC é publicado a cada quatro anos.

"Assistimos a uma deterioração da saúde mental dos adolescentes que participaram no inquérito HBSC, incluindo no Luxemburgo, marcada, entre outras coisas, por múltiplas queixas de saúde que aumentaram ao longo do tempo", declarou ao Contacto Carolina Catunda, investigadora da equipa da HBSC e da equipa da HBSC da Universidade do Luxemburgo (UNL).

Mas, como é possível que miúdos de 11, 13 e 15 anos já se sintam irritados e com dificuldades em dormir? E a que se devem as dores nas costas? Em geral, estas queixas são derivadas do sedentarismo dos adolescentes, por não praticarem exercício físico e "passarem horas demais, por vezes o dia inteiro, em frente ao computador", justificou ao Contacto o pediatra Patrick Theisen, da Sociedade Luxemburguesa de Pediatria. O estar sentado horas a fio, provoca dores nas costas, o ecrã excita e tira o sono, e no dia seguinte, os adolescentes vão para a escola, com horas a menos de sono e ficam irritados, explicou este especialista.

Por isso, Patrick Theisen aconselha os pais a imporem horários aos filhos para estar ao computador ou no tablet ou telemóvel, sobretudo à noite. "A partir das 20h00 não os deixem usar estes equipamentos". Aos adolescentes convida-os a encontrarem-se com os amigos ao ar livre e a realizarem atividades físicas em conjunto". Neste tempo de crise pandémica, com as devidas distâncias.

Menos consumos de álcool e tabaco

Outra boa notícia é em relação aos consumos de bebidas alcoólicas, de tabaco. "No Luxemburgo, bem como em muitos outros países que participaram no inquérito HBSC, constatamos uma queda significativa no consumo de álcool e tabaco, o que é muito positivo", avançou a investigadora Carolina Catunda.

Também o consumo da canábis diminuiu em relação a 2014. Mesmo assim, o Luxemburgo ainda se mantém na parte de cima da tabela com 13% das raparigas e 17% dos rapazes, de 15 anos a admitir o consumo.

Envolvem-se em confrontos físicos

Em relação a atitudes violentas, os adolescentes de 11 anos do Luxemburgo estão entre aqueles que se envolvem mais em confrontos físicos. O país situa-se no 7º lugar no ranking de todos os países, com 22% dos rapazes a admitirem essas agressões, muitas delas nas escolas.

"O facto do Luxemburgo ser um país onde coabitam imigrantes de muitas nacionalidades, entre eles as dos países latinos, de sangue quente, mais propensos a resolver os conflitos desta forma, errada, pode explicar esta percentagem", considerou uma professora do ensino do Português no Luxemburgo, que não se quis identificar."Até 2018, na minha escola, era raro o dia em que os adolescentes não se envolviam em agressões físicas, sobretudo os filhos de imigrantes e, muitas vezes da mesma nacionalidade. Por vezes, portugueses", conta a docente. Agora, adotaram novo sistema e "há menos violência".

Ainda na escola e quando questionados sobre se têm um grande apoio por parte dos docentes, os alunos de 15 anos do país, respondem negativamente, ocupando o 5º lugar a contar do fim da tabela, e muito abaixo da média geral. Para esta professora de português "os professores do Luxemburgo preocupam-se muito com os seus alunos e são muito competentes. A única diferença é que devido à sua natureza são mais distantes do que os professores de origem latina, que são de trato mais próximo e sorriso mais fácil. Talvez isso justifique estas respostas". Já para Andreia, mãe de um aluno de 12 anos, ainda há casos em que os alunos portugueses "se sentem discriminados" pelos professores. E o próprio sistema de ensino com o "ensino clássico e o ensino técnico" pode facilitar essa discriminação. Isto faz com que haja alunos filhos de imigrantes que sintam uma pressão maior para conseguir ter notas para entrar no ensino clássico. "Eu enquanto mãe tenho perfeita noção que pressionei sempre o meu filho de 12 anos a ter boas notas. Hoje está no ensino clássico e é o único português na turma dele".

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A comunicação com os pais

Outro dos problemas dos adolescentes do Grão-Ducado é a maior dificuldade em comunicar com os pais, sobretudo com o pai, do que a média dos jovens dos outros países. À questão sobre a facilidade em comunicar com o pai, os adolescentes de 11 anos e 15 anos, encontram-se em penúltimo lugar na tabela, apenas atrás da Bélgica. Os de 13 anos, ocupam o antepenúltimo lugar.

Do mesmo modo, em relação à mãe, aos 13 e aos 15 anos os adolescentes do Luxemburgo estão em antepenúltimo lugar. Aos 11 anos, sobem três lugares na tabela, sempre muito abaixo da média. Esta é uma das variáveis em que o "Luxemburgo difere negativamente da média internacional", vincou a investigadora Carolina Catunda que faz parte da equipa do estudo HBSC no Luxemburgo.

Contudo, esta cientista frisou que "as percentagens encontradas no país estão próximas das dos países fronteiriços". Além disso, para esta psicóloga da saúde, "a maioria dos adolescentes classificou a comunicação com a mãe/pai como fácil ou muito fácil, o que não se alterou entre 2014 e 2018". "O Luxemburgo não está assim tão distante da média" e é "sempre importante comparar com outros países idênticos", vincou. Por último, Carolina Catunda salientou também que a "perceção do apoio parental mostra uma melhoria importante de 2014 para 2018, pelo que é possível que a comunicação parental também siga esse padrão nos próximos anos".

Para Andreia, a mãe portuguesa do Luxemburgo esta menor facilidade de comunicação entre pais e filhos deve acontecer, sobretudo, nas famílias de imigrantes. E deu o exemplo dos portugueses. "São pais que trabalham muitas horas. Saem de casa muito cedo, e regressam tarde, alguns têm dois empregos, pelo que o tempo para estar com os filhos é muito reduzido".

"Os dados do Spotlight Report sobre saúde e bem-estar dos adolescentes são bastante encorajadores", disse Carolina Catunda. "Em geral, os adolescentes relatam experiências escolares positivas, boas relações sociais e uma saúde e bem-estar relativamente bons em geral", realçou. Para a maioria das variáveis estudadas, os adolescentes no Luxemburgo encontram-se "dentro da média dos países que participam no inquérito HBSC". Assim, as conclusões que podem ser retiradas do inquérito HBSC "podem ser alargadas aos adolescentes no Luxemburgo", concluiu esta investigadora.

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