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Emigrantes podem ser obrigados a arrendar as casas vazias que têm em Portugal

"Os emigrantes não estão salvaguardados e podem correr sério risco de arrendamento coercivo", alerta o presidente da Associação Lisbonense de Proprietários.

Governo português vai impor o arrendamento obrigatório das casas devolutas nos aglomerados urbanos.

Governo português vai impor o arrendamento obrigatório das casas devolutas nos aglomerados urbanos.

O Governo português vai adotar um regime de "arrendamento compulsivo" das casas devolutas, no quadro do "Programa Mais Habitação", apresentado na semana passada e que está a gerar enorme polémica em Portugal.

Embora este novo programa indique que os emigrantes proprietários de casas vazias em aglomerados urbanos portugueses, estejam excluídos desta medida, pelo facto do seu imóvel ser a residência em Portugal, a Associação Lisbonense de Proprietários não descarta que também eles sejam afetados.

Uma casa é considerada devoluta quando se trata de um imóvel localizado em aglomerado urbano e que está desocupado há mais de um ano. Esta é a definição que consta da apresentação do novo programa para a habitação como ponto de partida para o arrendamento compulsivo.

"A nosso ver os emigrantes não estão salvaguardados, pois o governo ainda não declarou quais são as suas intenções concretas", começa por dizer ao Contacto, o advogado Luís Menezes Leitão, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP).

Luís Menezes Leitão, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários.

Luís Menezes Leitão, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários. © Créditos: D.R.

Aliás, os portugueses residentes no estrangeiro e que possuam casas desocupadas podem até vir a ter problemas acrescidos, vinca este responsável. É que a notificação sobre domicílio devoluto "será enviada para o domicílio que consta em Portugal, e provavelmente, os emigrantes como não estão cá não responderão e aí corre-se um sério risco de que os emigrantes vejam os seus direitos afetados".

Os emigrantes têm todo o direito legítimo à sua propriedade em Portugal, e podem tê-la desocupada "para aí viverem quando regressarem ao país natal ou para os seus filhos irem morar", realça o professor catedrático.

Congelamento de rendas

Para o jurista, o programa apresentado pelo Governo português é um atentado aos direitos dos proprietários. Quem tem uma casa devoluta está sujeito a "um arrendamento à força, sob o risco de não conhecer os inquilinos, e sujeito a receber uma renda miserável".

"Esta é uma situação muito preocupante, estamos a regressar aos tempos do PREC, quando o ministro Vasco Gonçalves impôs uma medida semelhante e que levou à toma das casas vazias. Os proprietários não puderam escolher os inquilinos, ficaram com eles durante décadas. Alguns só saíram de lá quando morreram, outros ainda lá estão", lembra o presidente da ALP. E acrescenta: "Muitos revelaram-se maus inquilinos e os proprietários nada puderam fazer, e a receber rendas miseráveis".

Na altura, muitos emigrantes também "foram afetados e alguns acabaram por vender os seus imóveis para evitar o risco de arrendamento coercivo. Por isso, acho que os emigrantes têm sérias razões para estarem agora preocupados", diz Luís Menezes Leitão.

Luís Menezes Leitão frisa ainda que "esta é uma situação sem paralelo na Europa. Eu tive a preocupação de verificar se havia algum caso semelhante noutro país, questionei outras estruturas de proprietários, e nunca houve medida idêntica. Uma casa vazia poderá quando muito ver os impostos aumentarem, mas nunca ser arrendada à força".

Conselho aos emigrantes

O Governo anunciou também o congelamento das rendas, com um aumento "máximo de 2%, quando a inflação é de 9% São rendas de valores miseráveis em que não há garantia sequer que a renda corresponda minimamente ao valor de mercado. Isto na prática é uma expropriação das casas à força. Para um imóvel ser expropriado ele tem de se revestir de interesse público, mas com o novo programa do governo tal não acontece. É simplesmente apanhar uma casa vazia", indigna-se.

No final, o presidente da ALP deixa um conselho aos emigrantes portugueses: "O nosso apelo é que os emigrantes defendam os seus direitos e que estejam atentos a qualquer notificação que recebam nas suas casas em Portugal, pois correm o risco de verem a sua casa ser arrendada coercivamente. Se necessário recorram à nossa associação. Procuraremos evitar que esta situação gravíssima venha a acontecer".

Segundo o Instituto Nacional de Estatística, existem cerca de 730 mil casas devolutas em Portugal e com este novo pacote de medidas do "Programa Mais Habitação" pretende "aumentar a oferta de imóveis para habitação" e "aumentar o número de casas no mercado do arrendamento", como consta do documento de apresentação das medidas.

As medidas do "Programa Mais Habitação" foram aprovadas em Conselho de Ministros português, no final de fevereiro e os projetos de lei estão agora em consulta pública. Perante as polémicas propostas de lei, a consulta que foi agora prolongada até dia 24 de março, a pedido da Associação Nacional dos Municípios, sendo depois aprovadas no Conselho de Ministros de 30 de março.