Eleições. Boletins já começaram a chegar mas emigrantes estão divididos sobre votar pela segunda vez
No próximo fim de semana realiza-se a votação presencial, nos consulados, da repetição das eleições para o círculo da Europa. Os votos postais terão de chegar a Portugal até dia 23 para serem considerados válidos, mas até hoje alguns eleitores ainda não tinham recebido o seu boletim.
© Créditos: Lex Kleren/Contacto
Os boletins para os emigrantes poderem votar por correspondência na repetição das eleições para o círculo da Europa já começaram a chegar a algumas casas, mas o sentimento entre alguns emigrantes é de desilusão por todo o processo que levou à anulação de 157 mil votos neste círculo - o correspondente a 80% de votos - e à repetição do escrutínio que dará por concluídos os resultados das eleições legislativas realizadas no passado dia 30 de janeiro.
"A minha casa já chegaram os quatro envelopes e a casa de colegas de trabalho também, mas ainda ninguém me disse se iria votar", refere ao Contacto António Valente. O ex-vice-presidente do CLAE diz que de todas as pessoas que conhece que receberam os boletins de voto teve "conhecimento de algumas que não vão votar, pois pensam que não houve respeito na primeira vez" que o fizeram. António Valente e a família, quatro pessoas ao todo, inserem-se neste grupo, tal como o próprio já tinha dito ao Contacto a 14 de fevereiro, depois de os votos terem sido anulados, mas ainda antes de se saber se iria haver a repetição da eleição.
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Questionado nessa altura sobre se votaria novamente caso houvesse repetição de eleições no círculo da Europa, António Valente respondeu que "não", antevendo a mesma decisão em relação a muitos emigrantes no Luxemburgo, "porque parece que estão a brincar connosco", disse, na altura.
Os eleitores do círculo da Europa são chamados a votar novamente para as legislativas, após o Tribunal Constitucional ter declarado a nulidade das eleições nessas assembleias, na sequência da anulação de 80% de votos. Esta anulação ocorreu depois de o PSD ter protestado, durante a contagem, a 9 de fevereiro, contra o facto de terem sido misturados votos válidos com inválidos, não acompanhados de cópia do documento de identificação, como exige a lei.
Esses votos foram misturados porque tinha havido um acordo entre os partidos, incluindo o PSD. Contudo, aquando da contagem dos votos, os sociais-democratas defenderam que os válidos deviam ser separados dos não válidos, o que acabou por não acontecer e levar este partido a apresentar queixa na mesa de apuramento geral do círculo da Europa, que decidiu anular todos os votos das urnas onde houve essa mistura.
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O caso acabou no Tribunal Constitucional (TC) que declarou a nulidade da eleição e mandou repeti-la.
Ao contrário do círculo da Europa, a votação do círculo Fora da Europa não enfrentou o mesmo problema porque não foi apresentada nenhuma queixa à sua mesa de apuramento geral.
Decisão do TC não anulou sentimento de desrespeito
O Luxemburgo foi o segundo país do círculo da Europa com a maior participação eleitoral nestas últimas legislativas, que foram as mais participadas da emigração. No Grão-Ducado votaram 26,15% dos inscritos no país (10.534 votantes em 40.277 inscritos) face a 16,39% em 2019. Porém, essa subida de participação pode não se manter na repetição da eleição.
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No passado dia 24 de fevereiro, no programa da Radio Latina 'Linha Aberta', vários emigrantes manifestaram a sua opinião sobre a repetição da votação e a sua intenção de participar no novo ato eleitoral. A maioria dos eleitores neste novo escrutínio vai votar por via postal, uma vez que apenas poderão votar presencialmente aqueles que se tinham inscrito para o primeiro - 20 no caso do Luxemburgo. As opiniões manifestadas no programa mostram que os portugueses estão divididos quanto a votarem de novo.
"Nós só temos voz ativa se também formos ativos e fizermos a parte que nos compete", afirmou uma ouvinte de Esch-sur-Alzette, que ligou para o programa, defendendo que os emigrantes não devem deixar de votar novamente, cumprindo assim a sua parte, e que caso haja novas falhas também devem pronunciar-se e criticá-las. Contudo, houve também ouvintes que votaram da primeira vez e que enviaram a fotocópia do cartão do cidadão, como manda a lei, mas que afirmaram que nesta segunda vez já não vão votar. "Eu não voto porque acho que temos de passar um atestado de incompetência à política em Portugal, porque não somos produto de uma mercearia", afirmou um ouvinte residente em Steinfort.
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Independentemente da intenção de votarem novamente ou não, os ouvintes não pouparam nas críticas aos partidos, à organização eleitoral e aos próprios consulados pela anulação da primeira votação - facto inédito neste círculo eleitoral -, sinalizando o desrespeito que esta situação demonstrou em relação aos emigrantes.
O sentimento é partilhado pelas queixas que têm chegado a António Valente. Desde que todo este processo se desenrolou uns apontam críticas ao PSD, "que tinha concordado em validar todos os envelopes e depois voltou atrás", enquanto outros acusam os partidos "que chegaram a acordo sem consultar a Comissão Nacional de Eleições (CNE)". "Foi uma falta de respeito e de pouco reconhecimento para quem vive fora do país", transmitiu o antigo dirigente do CLAE.
Prazos apertados podem comprometer participação
Os prazos para a repetição deste ato eleitoral, sobretudo por causa do voto postal, levantam algumas questões quanto ao nível de participação dos emigrantes.
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Os portugueses que votam por correspondência deverão enviar os boletins por correio até dia 12 de março, sendo válidos todos os que chegarem a Portugal até ao dia 23, inclusive, desde que com a cópia do cartão do cidadão.
Recorde-se que 12 de março é também o primeiro dos dois dias seguidos dedicados à votação presencial nos consulados, para quem tenha feito essa inscrição na eleição anterior.
O calendário definido pela CNE, para a repetição da eleição, foi apresentado no dia 16 de fevereiro e apontou o prazo de 20 dias para que o Ministério da Administração Interna (MAI) conseguisse fazer chegar o boletim de voto à casa dos eleitores. Se os boletins tiverem sido remetidos no dia seguinte à apresentação da CNE, ou seja, a 17 de fevereiro, deverão estar nos destinos a 8 de março, esta terça-feira, tendo os eleitores três dias para votar e remeter o envelope para Portugal, uma vez que, segundo a CNE, devem "enviá-lo pelo correio antes do dia da eleição".
O Contacto sabe que há eleitores no Luxemburgo que até esta segunda-feira, 7 de março, ainda não tinham recebido os boletins.
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Numa nota enviada à comunicação social, no passado dia 22 de fevereiro, o MAI deu conta de que a documentação eleitoral já tinha começado a ser "enviada para os eleitores recenseados pelo círculo da Europa e que votam por via postal para repetirem a votação na eleição da Assembleia da República". Contudo, no mesmo comunicado, o ministério diz não ser possível à Administração Eleitoral "indicar qual o período máximo de tempo para as cartas chegarem às caixas de correio dos eleitores no estrangeiro, ou para a notificação da respetiva tentativa de entrega, pois tal depende dos operadores de correio locais".
Os votos por via postal serão considerados válidos se recebidos até 23 de março em Portugal. Já a repetição da votação presencial terá lugar nos consulados nos dias 12 e 13 de março, entre as 8h e as 19h locais. A lista dos locais de voto no estrangeiro está disponível na página da Comissão Nacional de Eleições.