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Israel-Palestina. "Acordo do século" divide EUA e ex-dirigentes europeus

O "acordo do século" não prevê a criação de um Estado soberano para a Palestina nos territórios ocupados por Israel durante a guerra de 1967, anunciou o jornal americano The Washington Post.

© Créditos: AFP

O "acordo do século" entre Israel e os palestinianos que a administração Trump pretende anunciar nos próximos dias não prevê a criação de um Estado soberano para a Palestina nos territórios ocupados por Israel durante a guerra de 1967, anunciou o jornal americano The Washington Post. Os detalhes do plano elaborado durante dois anos sob a direção do genro de Donald Trump, Jared Kushner, mostram a atuação parcial do governo norte-americano para favorecer Israel aceitando exclusivamente as ideias do primeiro-ministro Benjamín Netanyahu de manter os palestinianos em zonas segregadas da Cisjordânia.

De acordo com o Washington Post, os comentários de Kushner e de outros funcionários norte-americanos sugerem que "o plano descarta a estatalidade como premissa de partida dos esforços de paz". De uma só vez, os norte-americanos atiram por terra a ideia-chave da paz entre Israel e os palestinianos que esteve em cima da mesa durante mais de duas décadas.

No domingo, o presidente palestiniano Mahmoud Abbas declarou que as conversações com a administração norte-americana são "inúteis" e acrescentou que os próximos dias serão testemunhos "de acontecimentos muito difíceis", noticia o jornal espanhol Publico.es. Abbas interrompeu os contactos oficiais com Washington em dezembro de 2017 quando Trump reconheceu unilateralmente Jerusalém como capital de Israel. "Rejeitámos este acordo desde o princípio porque não inclui Jerusalém [como capital do Estado palestiniano] e não queremos um Estado sem Jerusalém ou sem Gaza". Esta é uma posição defendida pelos palestinianos desde a Conferência de Madrid em 1991.

No início desta semana, a chanceler Angela Merkel conversou ao telefone com Netanyahu para felicitá-lo pela recente vitória eleitoral. Fontes oficiais israelitas indicaram que a chanceler alemã evocou a criação de um Estado palestiniano para resolver o conflito, uma ideia que vai contra o conteúdo do acordo denunciado pelo Washington Post, onde se prevê apenas alguma autonomia limitada em certas zonas da Cisjordânia.

Saeb Erekat, um histórico dirigente palestiniano, contestou dizendo que o desejo da Casa Branca "não é um acordo de paz mas um acordo para destruir o processo de paz e o direito internacional".

Também esta semana, cerca de trinta antigos altos funcionários europeus - incluindo seis ex-primeiro-ministros, 25 ex-ministros dos Negócios Estrangeiros e dois ex-secretários-gerais da NATO - publicaram uma carta em que apelam ao adiamento do "acordo do século", argumentando que é injusto para os palestinianos. Os signatários pedem à Europa que rejeite a proposta. "Chegou o momento de que a Europa defenda os nosso parâmetros de princípios de paz em Israel-Palestina", diz o documento. E acrescenta que o Velho Continente devia rejeitar qualquer plano que crie um Estado palestiniano ao lado de Israel com Jerusalém como capital dos dois Estados.

"Infelizmente, a atual administração dos Estados Unidos afastou-se da tradicional política dos Estados Unidos", denunciam os signatários que acrescentam que o reconhecimento de Jerusalém como capital de uma só parte do conflito é uma demonstração de parcialidade. Os Estados Unidos "mostraram uma preocupante indiferença perante a expansão colonial israelita", concluem.

Bruno Amaral de Carvalho