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Cátia Gonçalves

Politóloga portuguesa defende direito de voto dos estrangeiros

A cerca de um mês do referendo, Cátia Gonçalves, licenciada em Ciências Políticas, apresentou uma tese de mestrado em que defende o direito de voto dos estrangeiros nas eleições legislativas luxemburguesas.

© Créditos: Paula Telo Alves

A cerca de um mês do referendo, Cátia Gonçalves, licenciada em Ciências Políticas, apresentou uma tese de mestrado em que defende o direito de voto dos estrangeiros nas eleições legislativas luxemburguesas.

Cátia Gonçalves, que obteve a dupla nacionalidade em 2009, apresentou na quinta-feira a tese “Direito de voto para todos e legitimidade democrática: o caso do Luxemburgo”, a convite da plataforma Migrações & Integração, que defende o “sim” no referendo, e da associação CID-Femmes.

No estudo de 80 páginas, concluído em 2014 na Faculdade de Direito e Ciências Políticas de Nantes, em França, a também conselheira comunal e presidente das Mulheres Socialistas no Luxemburgo analisa a situação do Grão-Ducado à luz do direito internacional, defendendo que o direito de voto “tem de deixar de estar ligado à nacionalidade, para passar a reconhecer uma cidadania de residência”.

A politóloga luso-luxemburguesa destaca os países que já permitem a participação política dos estrangeiros em eleições nacionais, como a Nova Zelândia, ou, de forma parcial, Portugal, que atribui o direito de voto a cidadãos brasileiros residentes no país “em algumas condições”. Para Cátia Gonçalves, que sublinha ainda a elevada percentagem de estrangeiros no Luxemburgo, a questão é essencial para combater o défice democrático.

“No caso específico do Luxemburgo, é também uma questão democrática, porque actualmente temos uma minoria de pessoas que determinam a política da maioria, e temos um problema, porque as pessoas têm os mesmos direitos sociais e económicos e as mesmas obrigações, mas não têm o mesmo poder de participação política nas decisões públicas”, diz.

Para a autora da tese, a exclusão dos estrangeiros das urnas em eleições nacionais “cria uma diferença de estatuto entre luxemburgueses, que não fizeram nada mais do que nascer de pais luxemburgueses ou nascer no Luxemburgo para ter a nacionalidade, e os estrangeiros que decidiram fazer a sua vida no país”.

Esta não é a primeira vez que a académica portuguesa nascida no Luxemburgo analisa uma questão política polémica. Em 2009, defendeu uma primeira tese de mestrado sobre o referendo do aborto em Portugal à luz do direito internacional.

A cerca de um mês do referendo sobre o direito de voto dos estrangeiros, agendado para 7 de Junho, Cátia Gonçalves diz que o Luxemburgo tem a oportunidade de fazer história, caso o “sim” vença na consulta popular.

“Seria uma posição pioneira, mas o Luxemburgo já foi pioneiro noutras decisões políticas: foi um dos primeiros países europeus a atribuir o direito de voto às mulheres, em 1919. O Luxemburgo pode ser visionário e servir de modelo à Europa”, defende.

No debate que se seguiu à apresentação da tese, a também conselheira comunal em Pétange foi questionada por um membro do grupo Nee2015, que defende o

“não” ao voto dos estrangeiros. Cátia Gonçalves refutou a acusação de que os estrangeiros passariam a ter “mais direitos” do que os luxemburgueses, alegadamente porque passariam a poder votar em dois países, explicando que os estrangeiros já são obrigados a optar por um único país nas eleições comunais e europeias.

O PERIGO DA EXTREMA-DIREITA

A presença de apoiantes do “não” tem sido uma constante nos debates organizados pela plataforma que defende o “sim”. Sublinhando que a intervenção dos partidários do “não” “é normal no debate democrático”, o porta-voz da ASTI, que integra a plataforma do “sim”, alerta para o perigo de infiltração de movimentos de extrema-direita.

“O que nós lamentamos é uma certa instrumentalização do referendo por algumas pessoas, utilizando as tácticas típicas da extrema-direita, com falsas informações, meias-verdades e mesmo mentiras, e com manipulações de factos, como a utilização de excertos de intervenções de cientistas políticos ou constitucionalistas retiradas do contexto, uma táctica habitual dos movimentos de extrema-direita na Europa”, disse Sérgio Ferreira ao CONTACTO, à margem do debate.

“É evidente que nem todos os opositores do direito de voto estão nesta linha, mas esses têm-se feito ouvir pouco, e aqueles que temos ouvido mais são os radicais”, lamentou o porta-voz, que deixa um apelo. “Esperemos que o debate se faça de outra maneira a partir de agora, com argumentos racionais, e que não se utilizem os medos e os cenários catastrofistas para a nação luxemburguesa para discutir esta matéria”.

Paula Telo Alves