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Os portugueses de Clervaux. Maria, a Princesa do Tua

A Liliana dos chocolates, a Sandra que trabalha na Comuna, o casal de dentistas, a Maria da mercearia e a Lurdes da loja de roupa. Estes são os portugueses que escolheram o Norte do Luxemburgo. E dali ninguém os tira.

Maria da Luz Pires, de Mirandela, é proprietária da mercearia Princesa do Tua há um ano.

Maria da Luz Pires, de Mirandela, é proprietária da mercearia Princesa do Tua há um ano. © Créditos: Anouk Antony

Jornalista

Maria da Luz Pires nasceu em Vinhais, há 45 anos. Os pais resolveram mudar-se para Mirandela e foi lá que estudou até ao nono ano. Depois desistiu de estudar e começou a trabalhar. Sempre em supermercados, durante 19 anos. Há nove, conheceu o marido, que também é de Mirandela, mas estava emigrado no Luxemburgo. Dois anos depois, decidiu ir ter com ele. Veio primeiro com a filha, que tem agora 16 anos, e mais tarde chegaram o filho, a nora e os netos.

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No início, trabalhou nas limpezas, porque não sabia a língua, mas uns anos depois conseguiu emprego como funcionária de uma mercearia no centro de Clervaux, em 2020. No final do ano passado, o dono decidiu fechar a loja e Maria aproveitou para ficar com aquele espaço. Escolheu o nome “Princesa do Tua” porque tanto ela como o marido são de Mirandela, na região do Tua. “É uma mercearia familiar. Temos os mesmos clientes quase todos os dias. Acaba por ser uma família. Digo sempre que é a família ‘Princesa do Tua’”, conta.

O início não foi fácil, confessa a portuguesa, que se viu obrigada a fazer “uma ginástica” financeira no primeiro ano, para conseguir manter a loja. “Desde então, houve alturas mais calmas. Agora está a funcionar bem. Trabalhei sempre sozinha, mas quero meter alguém a meio tempo, quando as coisas estiverem estabilizadas. Porque já se torna um pouco cansativo e trabalhoso quando estou sozinha, tenho de fazer tudo”, confessa a proprietária.

© Créditos: Anouk Antony

A maior parte dos produtos que se encontram na Princesa do Tua são portugueses. E vêm diretamente das regiões tradicionais de Portugal, assegura Maria da Luz. “Vamos buscar os nossos produtos a Rio de Moinhos, os bolos a Penafiel, as alheiras a Mirandela. Um pouco de cada, para que todos os clientes fiquem felizes”. Também trazem os vinhos, fumeiros, todo o tipo de frutos secos, frutas e legumes, tudo “sempre fresquinho”, garante. E para quem quiser tomar o pequeno-almoço, também bolos, torradas, tostas e servem café.

É uma mercearia familiar. Temos os mesmos clientes quase todos os dias.
Maria da Luz Pires

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Grande parte dos clientes da mercearia são portugueses, que passam lá quase todos os dias, mas a proprietária nota que já começa a haver alguns luxemburgueses e, aos fins de semana, também alguns turistas. Quanto aos produtos que são mais vendidos, Maria da Luz não tem dúvidas que o que tem mais saída são as alheiras. “Vendemos muito bem, porque são caseiras, feitas por um casal de Mirandela. Há muitas pessoas que vêm de Diekirch ou até de Dudelange para vir buscar as nossas alheiras”, revela.

No entanto, apesar dos clientes habituais da mercearia, o movimento no centro de Clervaux “já foi melhor”. Para a portuguesa, a comuna tem “perdido muito” nos últimos anos. “Tiraram tudo daqui: os bancos, os correios... Clervaux tem vindo a morrer ao longo dos anos. Precisava de algo novo para puxar clientes. Tirando o hotel e o castelo, não tem grande coisa. É preciso puxar outra vez o turismo”, assume Maria da Luz, garantindo que a cidade tem potencial. “É muito bonito. Tem uma montanha para quem gosta de caminhar e espaços verdes. É um bom local para as pessoas passarem vários dias para descansar”.

© Créditos: Anouk Antony

Apesar do pouco movimento, a proprietária da Princesa do Tua afirma que a melhor parte do seu trabalho é o contacto com o público. “Isto para mim não é um trabalho, sou feliz a fazer o que faço. Gosto de lidar com as pessoas. É uma felicidade estar aqui. Não tem pontos maus, só tem coisas boas”, assegura. Depois destes anos naquela mercearia, Maria da Luz sente-se em casa quando está em Clervaux. O que esta comuna tem de especial, ao seu olhar, é o facto de as pessoas “poderem passear à vontade e as crianças poderem brincar sem perigos”.

Quanto ao futuro, a portuguesa quer apenas continuar o seu negócio e manter a sua clientela feliz. “Não peço muito. Não sou muito ambiciosa. A única coisa que quero é ter dinheiro para poder pagar as despesas. Não quero ficar rica, quero fazer isto porque eu gosto, porque amo o que faço e ter contacto com o público”, justifica. Sobre um possível regresso a Portugal, Maria da Luz não imagina que isso seja uma realidade tão cedo. “Tenho saudades dos meus pais e a idade também começa a pesar um bocado, mas nos próximos tempos, principalmente agora com a crise, vou ficar por cá. Mas um dia quero voltar à minha terra”.