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OpenLux. Ativos de 15 mil franceses no Luxemburgo representam 4% do PIB do país vizinho

São mais do que italianos e alemães juntos, e até mais do que os luxemburgueses. O número de franceses que têm empresas registadas no Grão-Ducado representa 100 mil milhões de euros em ativos.

Bruno Carlos Amaral De Carvalho

A investigação de um grupo de meios de comunicação social sobre quem guarda as fortunas no Luxemburgo e sobre possíveis ilegalidades continua a dar que falar. Os ministros das Finanças e Justiça deram explicações na respetiva comissão no Parlamento e esta tarde os deputados discutem o tema. Mas há medida que os dias passam mais informações novas vão sendo divulgadas. Esta terça o Le Monde libertou novas informações sobre a análise que o grupo de jornalistas têm feito dos dados que recolheram. Na segunda-feira, tinham já revelado que há 55 mil empresas que gerem ativos no valor de pelo menos 6.500 mil milhões de euros e que 279 das 2 mil pessoas mais ricas do mundo têm domicílio fiscal no Grão-Ducado.

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O jornal francês retrata esta terça-feira o perfil de muitos dos que escolheram o Luxemburgo para proteger e fazer crescer a sua riqueza: "donos de grandes empresas, médicos e colecionadores de arte, futebolistas e produtores de filmes, consultores e motociclistas, escritores e herdeiros de grandes fortunas, proprietários de terras e proprietários de start-ups, gestores de PME e trapaceiros profissionais".

Afirma que o Governo luxemburguês se defende alegando que grande parte são emigrantes ou trabalhadores transfronteiriços originários de França mas os dados da investigação sublinham que só 25% dos 15 mil franceses declararam às autoridades viver no Luxemburgo. Em 56% dos casos, referiram viver em França. Segundo as conclusões da OpenLux, a grande maioria das empresas detidas por estes 15 mil franceses são holdings financeiras sem um escritório físico ou atividade local. Ou seja, diz o Le Monde, "puras caixas de correio".

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Dos cálculos realizados através da investigação dos extratos automáticos de milhares de balanços financeiros, chegou-se a um retrato aproximado da realidade. Estes cidadãos franceses têm dezenas de mil milhões de euros em ativos em empresas no Luxemburgo. São 40 mil milhões de euros no caso de residentes franceses no Grão-Ducado e 100 mil milhões de euros para os restantes franceses na mira da investigação. No total, estes valores equivalem a 4% do PIB francês.

Deste bolo financeiro, só uma fatia está depositada em contas bancárias: 7 mil milhões de euros. O restante está investido. A grande maioria dos 15 mil franceses utilizam o Luxemburgo como base para investir em empresas localizadas noutros países. O ministro das Finanças, Pierre Gramegna, defendeu a opção ao Le Monde: "Existem empresas com participações em muitos países, incluindo França. Faz todo o sentido que uma empresa que opera à escala global escolha um ou mais centros para centralizar as suas atividades de financiamento e participações financeiras", explicou.

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Segundo os responsáveis pela investigação jornalística, essa opção é de facto normal. A consolidação das participações dispersas numa sociedade holding, a fim de facilitar a sua gestão, é algo habitual. Contudo, a escolha do Luxemburgo em vez de França traz vantagens. Por exemplo, um francês não é tributado quando vende uma participação na sua sociedade holding luxemburguesa quando em França seria tributado a 4%. Os lucros dos seus investimentos também não estariam sujeitos a impostos, desde que permanecessem no Luxemburgo e não fossem pagos através de uma conta bancária em França. Poderiam, portanto, ser reinvestidos a custo zero a partir do Grão-Ducado.

De acordo com dados da OpenLux, no final de 2019, mais de 15 mil milhões de euros de lucros nunca foram redistribuídos aos acionistas, tendo sido acumulados em empresas luxemburguesas detidas por cidadãos franceses. Se fosse repatriado para França e sujeito ao imposto fixo de 30% sobre o rendimento do capital, esta fortuna poderia levar quase 5 mil milhões de euros para os cofres do Estado francês.

Mas de acordo com o Le Monde estas empresas não estão a abrigar dinheiro em segredo como na Suíça na era do sigilo bancário. Os esquemas anteriormente referidos são legais desde que se justifique a atividade económica e se explique porque tem domicílio no Luxemburgo, segundo um advogado do Grão-Ducado ouvido pela publicação.

Contudo, apesar de as autoridades fiscais terem apertado o cerco, o Le Monde dá vários exemplos de empresas que nada têm a ver com o Luxemburgo apesar de ali terem domicílio fiscal: um estúdio de videojogos em Paris, uma empresa de mobiliário em Lyon e uma fábrica de engarrafamento na Borgonha.

Ainda assim, para o jornal francês o Luxemburgo fez grandes progressos em termos de transparência depois da pressão da União Europeia e da OCDE. O fim do segredo bancário, a identificação dos beneficiários das empresas e melhor cooperação internacional são alguns dos avanços dos últimos anos. Contudo, a área de investigação de crimes económicos do Ministério Público francês revela que ainda se assiste a "empresas holding luxemburguesas em muitos casos de fraude fiscal, tanto para empresas como para particulares".

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