Contacto
OpiniãoA fava

Luxemburgo, precisamos de um plano para os domingos

A Páscoa e o Émaischen fazem pessoas felizes. É de certa forma um sinal.

© Créditos: Chris Karaba/Luxemburger Wort

Grande Repórter

Saí de Soleuvre ao fim da tarde, depois de um almoço de Páscoa que durou seis horas e me empaturrou estômago e coração. Nem é que eu ligasse muito ao feriado quando vivia em Lisboa.

Muitas vezes escapei-me ao banquete em família e tinha sempre desculpas afiadas na ponta da língua para fazê-lo: as horas de sono que me faltava pôr em dia, o facto de nunca ter sido profundamente religioso ou a embirração com o sabor do cabrito, prato tradicional da festividade.

Tenho tido Páscoas bem bonitas desde que me mudei para o Grão-Ducado.

Mas, desde que cheguei ao Luxemburgo, dou outra importância à tradição. Ainda que esteja longe do sangue, faço questão de passar o dia com os meus. Tenho tido Páscoas bem bonitas desde que me mudei para o Grão-Ducado.

Eram seis e meia da tarde quando me meti no autocarro para a capital. Meia hora depois, desci em Hamilius, e faltava tanto tempo para a conexão até casa que decidi cumprir o resto do caminho a pé. Depois de um dia nublado, o sol resplandecia agora num céu sem mácula.

Nenhuma nuvem, vento algum. A primavera por que ansiava há semanas apresentava-se finalmente. Ao fim da tarde deste domingo o dia era glorioso na capital.

Atravessei a Grand-Rue, depois a rue de la Boucherie, segui pela Sigefroi. Ao longo de todo esse caminho cruzei-me com famílias inteiras que tinham vindo passear pelo centro histórico, casais com muitos anos de história e outros que começavam a escrevê-la, bandos de amigos adolescentes e de meia idade.

As esplanadas estavam à pinha, os poucos restaurantes abertos também, mas as lojas todas fechadas para atender tamanha urbanidade. Continuei ainda assim feliz: era domingo, feriado, e eu a ver a capital cheia de vida.

Na manhã seguinte, voltei ao centro para o Émaischen. Gosto destas tradições luxemburguesas que enchem as ruas de gente nos dias em que elas costumam estar vazias. Há o Mantelsonnldeg no outono, ou domingo dos casacos, e o Luxemburgo enche-se de bancas na rua para as pessoas comprarem as vestes de inverno.

Há a Braderie, que fecha avenidas em domingos do verão, para que o país prepare as compras para o final das férias. Há a Schouberfouer, claro, que tem diversão nas três semanas que encerram a época estival. Há os mercados de Natal.

Ler mais:Fotos. 'Émaischen' volta a animar o centro da capital

E há este Émaischen na segunda feira de cinzas, que a Anne me explicou ser tradição do século XIX. Vinham os oleiros vender cerâmica à cidade e traziam passarinhos de barro para a miudagem. Este ano ouvi o chilrear das crianças, sim.

E a campanha eleitoral que todos os partidos decidiram fazer para as municipais. Lojas fechadas, restaurantes abertos e as calçadas ferviam.

O meu ponto é este: o Luxemburgo é uma festa à sexta e é outra festa ao sábado. Só que depois é deserto aos domingos e feriados, precisamente os dias que a maioria dos cidadãos tem disponível para amar o lugar onde habita.

A Páscoa e o Émaischen fazem pessoas felizes. É de certa forma um sinal: uma capital europeia tem de saber fazer planos ao domingo. Há gente disposta a trazer animação à cidade e há gente disposta a prová-la. Só falta um programa que alimente essa possibilidade. De janeiro a dezembro.

(Grande Repórter)

NOTÍCIAS RELACIONADAS