Contacto
Energia

UE. França reúne apoios para incluir energia nuclear nas fontes limpas

Cerca de uma dezena de Estados-membros juntaram-se esta terça-feira à iniciativa francesa. Luxemburgo e Portugal continuam a defender renováveis e hidrogénio e firmam parcerias.

© Créditos: Chris Karaba/Arquivo LW

Jornalista

A França está a criar uma aliança de países para defender a indústria de energia nuclear, no âmbito das negociações da próxima fase de transição energética para fontes mais limpas, na União Europeia, noticia a Bloomberg.

A ministra francesa da Energia, Agnes Pannier-Runacher, convidou 12 dos seus homólogos europeus para um pequeno-almoço à margem das reuniões que decorrem em Estocolmo, entre ontem e esta terça-feira. O objetivo desse encontro paralelo foi discutir como a energia nuclear pode ajudar a salvaguardar a segurança energética, ao mesmo tempo que reduz as emissões de carbono, refere a agência americana de notícias de economia, citando o gabinete da ministra.

A França, que obtém a maior parte da sua eletricidade de reatores nucleares, está a tentar mobilizar outros Estados-membros para que reconheçam a energia nuclear como fonte limpa e para que esta seja incluída nos compromissos para atingir os objetivos climáticos comunitários.

Ler mais:Invasão da Ucrânia pode acelerar transição energética

"Os EUA, o Reino Unido, a Coreia do Sul, a China, a Índia e até mesmo o Japão estão a considerar a utilização da energia nuclear como um meio importante para descarbonizar as suas economias e precisamos de estar no mesmo patamar", afirmou Agnes Pannier-Runacher na segunda-feira.

Esta visão tem sido recebida com ceticismo por Berlim, mas Paris conseguiu já obter de Bruxelas um reconhecimento favorável relativamente ao hidrogénio renovável produzido em países com uma produção energética de baixo teor de carbono, incluindo a nuclear.

Nuclear e hidrogénio verde

A França está, por isso, a fazer pressão para que o nuclear seja considerado uma fonte de energia limpa, enquanto países como a Espanha e a Alemanha preferem concentrar-se no hidrogénio proveniente das energias renováveis, como o vento ou a energia solar -o chamado "hidrogénio verde".

O próximo campo de batalha é a definição de "hidrogénio verde" numa diretiva da UE conhecida como RED3, que estabeleceria objetivos para a utilização desta fonte de energia na indústria e nos transportes.

A UE vê o hidrogénio como um pilar fundamental dos seus esforços para reduzir as emissões em 55% até 2030 e o resultado das negociações poderá comprometer o projeto para transportar o combustível de Barcelona para Marselha e depois para Berlim através de um oleoduto, conhecido como BarMar ou H2Med.

A França já chegou a um compromisso com a Alemanha para permitir que a energia nuclear e o gás natural recebam financiamento de investidores ambientais.

Embora isso tenha acrescentado as duas fontes de energia à chamada taxonomia da UE - uma lista de atividades consideradas em conformidade com a transição do bloco comunitário para a neutralidade climática - persistem ainda preocupações de que a mudança possa desviar o investimento das energias renováveis para outras.

Mais de 10 países apoiam proposta francesa

No que respeita à energia nuclear, a iniciativa francesa está a ser bem acolhida por vários países da UE.

Ler mais:No cinturão nuclear que rodeia o Luxemburgo

"Estamos felizes por o nuclear, de alguma forma, ter voltado à discussão na UE - há alguns anos era uma espécie de tópico proibido", afirmou Anna Moskwa, ministra do Clima e do Ambiente da Polónia, citada pela Bloomberg. A governante acrescentou que "é do interesse comum desenvolver fontes energéticas estáveis, e foi por isso que a Polónia decidiu desenvolver o nuclear", explicou.

À ministra polaca juntaram-se os ministros da Roménia, Bulgária, Eslovénia, República Checa, Suécia, Itália, Eslováquia, Hungria, Croácia, Holanda e Finlândia na reunião marcada para esta manhã, segundo o gabinete da ministra francesa Agnes Pannier-Runacher.

A proposta francesa de uma aliança nuclear pretende "assegurar investimentos inteligentes pelo preço mais baixo possível", disse o ministro holandês da Energia, Rob Jetten, sublinhando que esta é uma proposta "inteligente" do ponto de vista do investimento em fontes de energias alternativas baixas em emissões de carbono.

Renováveis e hidrogénio: Luxemburgo começou reuniões com Portugal

As reuniões de ministros da UE sobre questões como a energia e os transportes e mobilidade, em Estocolmo, começaram ontem e o primeiro encontro de Claude Turmes foi com a secretária de Estado da Energia e Clima de Portugal, Ana Fontoura Gouveia.

Ler mais:Luxemburgo e Portugal assinam declaração para excluir energia nuclear do financiamento europeu

Segundo um post publicado na sua página de Twitter, o ministro da Energia luxemburguês reuniu-se com a sua homóloga portuguesa para "estabelecer as bases de uma forte parceria energética" entre os dois países, assente nas fontes renováveis e no hidrogénio.

"Os nossos países estão e continuarão a estar fortemente ligados", sublinhou Claude Turmes.

No caso da energia nuclear, Portugal e Luxemburgo têm partilhado a mesma visão. No final de 2021, na COP26, os dois países estiveram entre um conjunto de estados subscritores, juntamente com a Alemanha e Bélgica, de uma declaração que excluía a energia nuclear das fontes energéticas consideradas sustentáveis e dos alvos de financiamento europeu em matéria de energia.

A proximidade com o Grão-Ducado da central de Cattenom e os sucessivos incidentes nos seus reatores, no último ano, continuam a lançar uma sombra sobre o recurso à energia nuclear como alternativa às fontes energéticas tradicionais e mais poluentes, mesmo considerando a dependência do país em relação a estas.

No início de 2022, Claude Turmes admitia, numa entrevista ao jornal económico francês La Tribune que “o Luxemburgo é dependente das suas importações energéticas – a 100 por cento para o petróleo, a 100 por cento para o gás e a 85 por cento para a eletricidade.”

Como referia a reportagem do Contacto, em abril do ano passado, 70 por cento da energia que o Luxemburgo importa vem da Alemanha e 23 por cento de França. Quase tudo o que chega de França é usado para abastecer as siderurgias da ArcelorMittal – e, segundo o Instituto de Regulação do Luxemburgo, em média sete por cento dessa energia é de origem nuclear.

Ler mais:Luxemburgo tem a menor quota de energia renovável da UE

O plano do governo do Grão-Ducado passa, contudo, pela aposta nas renováveis, e o objetivo é aumentar a produção elétrica verde para 25 por cento do consumo no país até 2030.

Há um acordo com a Dinamarca para a instalação de uma plataforma eólica no Mar do Norte nos próximos anos, que permitiria reduzir a dependência do país.

Ainda assim, o caminho do Luxemburgo é longo. Os dados mais recentes do Eurostat, publicados em janeiro deste ano, mostram que a proporção de energia verde no consumo final bruto no Grão-Ducado é a menor entre os Estados-membros.

De acordo com o gabinete de estatísticas europeu, a taxa de energia proveniente de fontes renováveis no consumo final no Grão-Ducado era de 11,73%, em 2021, um valor muito abaixo da meta europeia de consumo de energias renováveis, como eólica e solar, estabelecida em 32% até 2030.

(Com Bloomberg)