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Crise da energia

Ministros europeus não chegam a acordo sobre embargo ao petróleo russo

Ao fim de doze dias de conversas, a Hungria continua a levantar "questões económicas" para não conseguir cortar a dependência em 100% da Rússia. A UE vai enviar mais 500 milhões de euros para armar a Ucrânia e quer acelerar a adesão dos países dos Balcãs Ocidentais que são agora "um presente para a Rússia".

Trabalhadores numa refinaria na Hungria, perto de Budapeste, que recebe o crude russo. País tem sido um dos opositores do embargo europeu ao petróleo russo.

Trabalhadores numa refinaria na Hungria, perto de Budapeste, que recebe o crude russo. País tem sido um dos opositores do embargo europeu ao petróleo russo. © Créditos: Attila Kisbendek/AFP

Jornalista

Doze dias após Ursula von der Leyen ter anunciado no Parlamento Europeu a proposta de embargo total ao petróleo russo até ao fim do ano– como a parte mais substancial de um sexto pacote de sanções - esta proposta ainda não foi aprovada pelos países da UE. O maior obstáculo? O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán tem dito que tal decisão seria uma "bomba nuclear2 para a economia húngara que depende neste momento a 100% do petróleo russo. E que precisaria de mais tempo do que "até ao fim do ano2 para aceitar a medida. Segundo o que tem saltado para os media, a Comissão já teria acenado com uma data especial para a Hungria, de mais dois anos. Mas mesmo assim, durante estas duas semanas, as negociações estão empatadas

Nesta segunda-feira, após uma reunião dos ministros dos Negócios Estrangeiros da UE que demorou perto de onze horas, a Hungria continuou a não aceitar as condições que a Comissão Europeia lhe oferece para assinar o pacote (que tem que ser aprovado por todos os 27 países para entrar em vigor). O embargo ao petróleo russo é visto pelos meios políticos europeus como a principal arma para secar o financiamento do Kremlin e da máquina de guerra de Putin.

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Mudar o pipeline da Hungria vai custar "tempo e dinheiro"

O chefe da política externa europeia, Josep Borrell, explicou segunda-feira ao fim do dia aos jornalistas que não sabe quanto tempo a discussão pode ainda demorar e que "as dificuldades que a Hungria apresentou podem ser medidas em tempo, para poder adaptar-se, e nos custos para o fazer". Segundo Borrell, o ministro húngaro dos Negócios Estrangeiros húngaro explicou que a adaptação do país tem duas dimensões: "A estrutura das refinarias e a capacidade do pipeline. E há um custo de mudar a estrutura das refinarias e prolongar o pipeline que vem do mediterrâneo" para desativar o russo. Isto seria uma fatura a pagar pela UE aos húngaros de uma só vez.

Além disso, explicou, há o custo estrutural e prolongado no tempo - e mais difícil de calcular - de comprar em vez do petróleo russo, um outro mais caro. O assunto foi abordado "de forma muito positiva", disse Borrell, mas no final da discussão foi decidido reenviar o processo para discussão no seio da Coreper (os embaixadores em Bruxelas dos 27 países), "porque era tecnicamente muito complicado e não era possível alcançar um acordo político hoje".

Segundo Josep Borrell a Hungria explicou a sua posição em "termos económicos e não em termos políticos", e o representante da Comissão Europeia admitiu aos jornalistas que os números que o país apresentou "são de facto muito altos". De qualquer maneira, explicou, nem estava na agenda chegar a acordo neste Conselho de Ministros de Negócios Estrangeiros, sabendo-se antecipadamente que iria ser complicado, havendo ainda discussões técnicas para resolver.

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Os três testes da União Europeia

A proposta inicial da Comissão, apresentada a 4 de maio, era de quem em seis meses – desde a publicação do diploma das sanções - deixaria de ser importado crude (o petróleo em bruto) e até ao fim de 2022 todos os produtos de petróleo russos. "Pretendemos maximizar a pressão sobre a Rússia e minimizar os danos colaterais para a UE e para a Ucrânia", disse von der Leyen.

Com o aproximar dos prazos propostos pela Comissão para banir o petróleo russo, Borrell adiantou que a "UE tem que acabar com a dependência do gás, petróleo e carvão que vêm da Rússia. E isto é algo que tem que ser feito progressivamente e o mais depressa possível".

Como mensagem final, o chefe da diplomacia europeia explicou que a UE está a enfrentar três testes: "O teste da guerra, o da resiliência e o da legitimidade. Todos os três são importantes, porque a guerra estava ausente da nossa imaginação. E agora estamos a enfrentar uma guerra e a enviar armas para alguém que está a morrer e a sofrer um ataque bárbaro. Mas estamos a enfrentar uma guerra de larga escala e estamos a mobilizar os nossos recursos"

Não aceitar a adesão dos Balcãs Ocidentais é um "presente para a Rússia"

Em relação à adesão à EU dos países dos Balcãs Ocidentais, Borrell pediu que o processo de adesão avançasse o mais depressa possível "de preferência até ao final da presidência francesa", que termina em junho. O processo de adesão dos seis estados – Albânia, Bósnia-Herzegovina, Macedónia do Norte, Montenegro, Kosovo e Sérvia – teve o tiro de partida em 2003 e tem vindo a arrastar-se desde então. "E é agora mais importante que nunca porque a propaganda e a desinformação russa está muito espalhada nos Balcãs".

Borrell entende que é urgente proteger estes países, que ao apoiarem a política externa da UE estão a tornar-se alvos potenciais de Putin. "Apreciámos a coragem estratégica de muitos destes países que alinham com a nossa política externa e sanções à Rússia". E, embora dois dos Balcãs países ainda não se tenham comprometido com o alinhamento da UE, Borrell salientou que esses Estados votaram a expulsão da Rússia do Conselho de Direitos Humanos da ONU. "Esperamos, no entanto, que alinhem completamente com a nossa política externa", explicou Borrell, salientando que "manter laços com Putin não é compatível com construir um futuro conjunto com a UE". E , disse o chefe da diplomacia europeia, "ser neutro em relação à guerra na Ucrânia é um conceito falso. Um país invadiu outro. Não podemos ignorar isto".

Quanto à necessidade de incluir os Balcãs Ocidentais com urgência no clube europeu, Borrell explicou que, "a Albânia, o Montenegro e a Macedónia do Norte alinham completamente com as nossas decisões em política externa e por causa disso podem ser expostos a mais ameaças da Rússia. Estar connosco a defender as leis internacionais pode ter um custo e de facto, a Albânia e a Macedónia foram consideradas como países 'não amigos' pela Rússia". Também a Bósnia-Herzegovina e o Kosovo alinharam com a UE e, por isso, estão em risco de várias formas de ataque vindos de Moscovo, incluindo os ataques híbridos.

Por isso, disse Borrell, foi dito aos seis ministros dos Negócios Estrangeiros dos Balcãs Ocidentais que participaram na reunião via videoconferência, que deveriam "agir de forma mais estratégica no que diz respeito a problemas internos, reformas, e no que diz respeito ao solucionar de assuntos bilaterais, porque há uma necessidade de reconciliação entre eles", para acelerar o processo. E, avançou, especialmente as negociações com a Albânia e Montenegro que devem ser lançadas imediatamente. "Todos vemos que este atraso é insustentável. Não podemos esperar que eles cumpram todos os critérios. Esta situação está a prejudicá-los e a prejudicar-nos a nós. Está a custar-nos credibilidade e perspetiva política. É um presente para a Rússia. Quero sublinhar como representante da política externa europeia que vou pôr todo o meu empenho neste processo".

Mais apoio à Ucrânia: 500 milhões de euros para armas

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia, Dmytro Kuleba, participou também na reunião dos chefes da diplomacia da UE e foi-lhe prometido, segundo Borrell, "um apoio contínuo na luta contra a agressão russa" e mais 500 milhões de euros do Fundo Europeu de Paz para a compra de equipamento militar. Até ao momento (e incluindo estes prometidos 500 milhões) a UE já se comprometeu com um total de 2 mil milhões de euros para a defesa militar ucraniana. Mas dentro da União vários outros países financiaram ou enviaram material militar diretamente.

O futuro e a reconstrução do país – na qual a Comissão Europeia já prometeu envolver-se desde que aceitou a candidatura do país à UE – foi também discutido. Quanto às concessões para a Rússia aceitar um cessar-fogo, a posição da diplomacia europeia é que "não iremos reconhecer um único quilómetro quadrado da Ucrânia tomado pela Rússia. Tal como não reconhecemos a Crimeia. Nós defendemos a união territorial da Ucrânia", afirmou.

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A batalha da narrativa na fome mundial

Outro dos pontos discutidos foi de encontrar soluções para facilitar o comércio internacional a partir da Ucrânia. Charles Michel, o presidente do Conselho Europeu, esteve na semana passada em Odessa, onde viu os cereais armazenados sem poderem chegar ao porto e, esta segunda-feira, Josep Borrell salientou que a UE tem "que ajudar a Ucrânia a continuar a produzir e exportar cereais e trigo. A capacidade de armazenamento da Ucrânia está completa. E tem que despejar para receber a próxima colheita. Há muitas ideias sobre como desbloquear Odessa, mas de momento não há nada de concreto. E há o problema de desminar as águas e as estradas até ao porto".

Outra das batalhas entre os aliados da NATO e a Rússia segundo Borrell é a "batalha da narrativa". Porque, disse, "a Rússia tenta passar a culpa do impacto mundial da guerra não só para as suas vítimas mas também para a UE e para o Ocidente. Dizem que a crise é a consequência das sanções, as consequências são de a Rússia estar a destruir, pilhar e bombardear os campos ucranianos. E os navios russos estão a bloquear os portos do mar negro. Quando a Rússia impede que o trigo russo seja exportado tem certamente um impacto real na vida diária das pessoas em África".

Em relação ao perigo de grandes fomes – sobretudo em África, por causa dos cereais estarem presos na Ucrânia – Borrell explicou que a UE está a trabalhar "com os ministros do G7 e com o Programa Alimentar da ONU para mitigar os efeitos da guerra. E isto vai ser um grande desafio para os membros do G20". Na próxima reunião, em Washington, pedida pelos Estados Unidos para debater a questão, Borrell espera "que a questão da segurança alimentar e preços da energia estejam muito na agenda. Porque o mundo precisa".