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Habitação. “Temos medidas para evitar que os preços continuem a aumentar rapidamente”

“Estamos muito confiantes em relação ao futuro”, afirma o ministro das Finanças, Pierre Gramegna, em entrevista ao Contacto.

© Créditos: Gerry Huberty

O acesso à habitação, a maior preocupação da população que vive no Luxemburgo é uma das prioridades do Orçamento de Estado para o próximo ano. O ministro das Finanças, Pierre Gramegna, em entrevista ao Contacto revela que estão previstas “determinadas medidas que deverão permitir evitar que os preços continuem a aumentar tão rapidamente, como acontece atualmente.” “Reduzir a amortização acelerada que existe atualmente para os imóveis que são para arrendar” é uma das medidas previstas.

Para além do orçamento, o Governo aprovou um pacote de investimentos de quase 550 milhões de euros para financiar a construção de alojamentos a preço acessível, nos próximos anos. “É necessário aumentar a oferta e eliminar as medidas que favorecem o aumento dos preços. É isso que estamos a fazer”, afirma o ministro das Finanças.

Aumentar o investimento público é outra das palavras de ordem do Orçamento de 2021. Cerca de 4% do Produto Interno Bruto (PIB), a riqueza produzida anualmente no Grão-Ducado, será canalizada para investimentos públicos, porque é a única forma de garantir o emprego e o lucro no futuro, sublinha o ministro responsável pela pasta das Finanças. “Os investimentos são muitas vezes vítimas de cortes em períodos de crise”, uma receita que não agrada a Pierre Gramegna.

Apesar do impacto da pandemia acredita que “vamos mantermos abaixo do limite dos 30%” do défice público. E em 2021 “com o relançamento da economia conseguir travar o aumento da dívida.”

Quanto ao risco do disparar do número de pessoas sem trabalho afirma que “o crescimento do desemprego foi muito mais reduzido face ao que esperávamos.” O instrumento do desemprego parcial que foi prolongado por mais seis meses teve um papel determinante em manter o desemprego controlado.

O que esperar do futuro? “Estamos muito confiantes em relação ao futuro. Porque considerarmos que a pandemia deverá estar controlada a partir do momento em que as vacinas sejam possíveis”, responde.

Assim acaba a principal causa da recessão atual e “não existe qualquer obstáculo ara que a economia retome o funcionamento de uma forma normal.”

Mas atenção que a economia não vai voltar a ser a mesma. “Os que acreditam que esta pandemia é apenas um acidente de percurso e que dentro de um ano ou dois anos, não se falará mais nela, enganam-se!” Depois das lições aprendidas com esta pandemia será “necessário desenvolver o crescimento de uma forma diferente no futuro.”

Quais os principais objetivos do Orçamento de Estado para 2021?

Este é um orçamento que é centrado em cinco grandes eixos principais: assegurar a igualdade fiscal; garantir um investimento público muito elevado; assegurar a competitividade das empresas; garantir o alojamento e promover a economia verde e a sustentabilidade da economia.

Uma das marcas deste Orçamento de Estado é a subida substantiva do investimento público. Qual o objetivo deste aumento do investimento público?

É claro que os investimentos são muitas vezes a vítima de cortes em períodos de crise. Vimos isto acontecer em 2008/09, quando muitos países reduziram o seu investimento. E o investimento representa os empregos e os lucros do futuro. Por isso é importante evitar cair nessa tentação de cortar e, por isso decidimos, apesar do défice orçamental relevante deste e do próximo ano, não cortar no investimento. E vamos claramente manter o investimento público acima dos 4% do Produto Interno Bruto (PIB), que é um nível muito elevado em termos de comparação ao nível internacional com os outros países europeus.

Não existe o risco da intensificação da epidemia, provocar um aumento da percentagem do défice público face ao PIB, no próximo ano?

Neste domínio colocámos claramente todas as cartas na mesa, como nos obrigam as regras europeias. Conseguimos, em 2019, reduzir a percentagem da dívida pública em relação à riqueza do Luxemburgo em cerca de 20%, no final do ano.

Evidentemente, que para sustentar a economia durante a epidemia, fizemos um empréstimo de 2,5 mil milhões de euros. Por isso aumentámos o peso da dívida, mas ela mantêm-se durante este ano e no próximo ano, abaixo dos 30% de dívida em relação à nossa riqueza. É preciso dizer que esta percentagem de 30% é uma barreira limite que o Governo impôs a si mesmo e que corresponde a metade do limite previsto pela União Europeia no Pacto de Estabilidade e Crescimento que prevê que podemos ter um endividamento até 60%. Por isso, o Luxemburgo tem uma grande margem de manobra. Mas no próximo ano, vamos em todo o caso, mantermos abaixo do limite dos 30% e esperamos que com o relançamento da economia, no próximo ano, conseguir travar o aumento da dívida.

O Conselho Nacional de Finanças Públicas considera que a dívida pública arrisca a passar a barreira dos 30% e lamenta que o Governo não tenha considerado o cenário mais negativo estimado pela Statec (instituto nacional de estatística luxemburguês). Porque é que não considerou este cenário na elaboração do orçamento?

Consideramos o cenário do Statec que era o mais provável, o que foi elaborado no primeiro semestre. Hoje estamos quase no fim do ano 2020, e podemos afirmar que o cenário mais negativo do Statec não se concretizou. Por isso fizemos bem em seguir o cenário principal do Statec e foi com base nesse cenário que baseamos as nossas hipóteses para os anos seguintes e, em particular para elaborar o orçamento de 2021. Penso que escolhemos o cenário que acabou por se concretizar diante dos nossos olhos.

Atualmente é quase impossível conseguir um alojamento no Luxemburgo para um português, tende em conta o preço dos apartamentos. Não acha que as medidas previstas no Orçamento de Estado são insuficientes para resolver este enorme problema do alojamento?

O ministro das Finanças tem nas suas mãos uma parte da solução, no que diz respeito ao alojamento, mas não toda a solução. No Orçamento de Estado para o próximo ano temos previstas determinadas medidas que deverão permitir evitar que os preços continuem a aumentar tão rapidamente, como acontece atualmente. Propusemos, mas a responsabilidade de votar estas propostas cabe à Câmara de Deputados de reduzir a amortização acelerada que existe atualmente, para os imóveis que são para arrendar. Esta é uma primeira medida. Prevemos também – não na lei do Orçamento, mas numa legislação apresentada diretamente pelo ministro da Habitação, Henri Kox, nos próximos anos, um aumento considerável do crédito para construir habitações, por iniciativa dos poderes públicos, para habitações a custos controlados. Assim a quantidade de alojamento a custos controlados que será construída e disponibilizada pelo Estado vai aumentar de forma significativa nos próximo anos. Assim é necessário aumentar a oferta e eliminar as medidas que favorecem o aumento dos preços. É isso que estamos a fazer.

Com o previsível crescimento do desemprego, os custos com o sistema de Segurança Social vão aumentar. As estimativas para os anos seguintes mostram que o sistema de segurança social será viável nos próximos anos?

Sim. Se olharmos para a situação no Luxemburgo ela é inviável se a comparamos com os países estrangeiros, porque o nosso sistema de segurança social liberta o excedente. Esses excedentes estão em ligeira baixa nos próximos anos, mas ainda temos um excedente no sistema de Segurança Social.

Em segundo lugar, prevemos reembolsar à Caixa Nacional de Saúde (CNS) certas despesas efetuadas no decorrer deste ano, como por exemplo a baixa por razões familiares, que foi aplicada durante a pandemia e que representa despesas para além dos 200 milhões de euros. É o Orçamento de Estado que assume essa despesa, o que melhora a situação da Caixa Nacional de Saúde. Por agora e, no próximo ano, não haverá problemas com o equilíbrio do Sistema de Segurança Social.

No domínio social espera-se que o desemprego aumente, fortemente nas comunidades migrantes, que inclui os portugueses. O que é que prevê no Orçamento para responder a esse problema?

Até agora, o desemprego ainda não aumentou durante o ano de 2020, sobretudo porque utilizamos a fundo o sistema de desemprego parcial que permite evitar que as pessoas caiam no desemprego. E pouco a pouco, quando a economia retomar, as pessoas que estiveram em desemprego parcial retornam à empresa e a empresa pode reiniciar-se muito rapidamente. O crescimento do desemprego é muito mais reduzida face aquilo que esperávamos com o lockdown do mês de abril.

Acredita que essa situação vai manter-se nos próximos meses?

Sim. Estamos muito confiantes em relação ao futuro. Porque consideramos que a pandemia deverá estar controlada a partir do momento em que as vacinas sejam possíveis. E assim que a causa da recessão atual tenha um fim, não existe qualquer obstáculo para que a economia retome o funcionamento de uma forma normal.

A reforma fiscal prevista para 2021 não vai concretizar-se. Quais são as principais implicações para as empresas desta decisão?

No projeto de Orçamento de Estado estão previstas várias medidas fiscais pontuais que foram introduzidas com finalidades muito claras. Por exemplo, se tiver em conta os investimentos feitos no domínio social, no domínio da conservação da energia. Se fizerem, um investimento nestes domínios poderão ter deduções fiscais importantes. Previmos para a praça financeira uma redução da taxa de impostos, se os fundos de investimento forem investidos nos ativos sustentáveis. Temos uma série de medidas pontuais que permitem modernizar a nossa fiscalidade e introduzir mais justiça fiscal.

E estamos prestes a mudar a tributação dos fundos de investimento especializado que fazem grandes investimentos em imóveis do Luxemburgo em que existia um nicho fiscal que permitia evitar todo o pagamento de impostos nos imóveis situados no Luxemburgo. Ou seja, nós tomamos uma série de medidas no setor da fiscalidade.

O que faz alusão é a uma reforma geral fiscal que estava previstas no programa de Governo da coligação e que por agora, porque estamos a ver qual será o grau de recuperação dos próximo ano, e só depois poderemos definir certos detalhes para essa revisão fiscal geral.

Uma das hipóteses faladas recentemente pelo líder do CSV foi a possibilidade de criar um imposto sobre as grandes fortunas. O que pensa deste sistema?

O imposto sobre as grandes fortunas não existe no Luxemburgo, foi abolido em 2006. O mecanismo continua a existir para as empresas.

Mas no programa de coligação governamental a criação de um imposto sobre as grandes fortunas para as pessoas individuais não está previsto. Nunca esteve previsto e não surge no programa.

Há muitos economistas e organismos internacionais que dizem que a economia nunca mais voltará a ser a mesma. No seu entender o que vai mudar no sistema económico pós-pandemia?

Tem toda a razão. Os que acreditam que esta pandemia é apenas um acidente de percurso e que dentro de um ano ou dois anos, não se falará mais nela, enganam-se! Penso que este vírus que fechou parcialmente as nossas economias durante meses, demonstrou uma série de fraquezas do nosso modelo de desenvolvimento no Luxemburgo, na Europa e no mundo e que essas fraquezas tem que ser resolvidas. Por exemplo, enquanto durante os meses de março e abril, muitas economias de países desenvolvidos estiveram paradas, vimos que o planeta começou a respirar melhor, que os rios se tornaram mais limpos, que o mar voltou a ser transparente e se tornou mais fácil de respirar.

O que demonstrou que atividade humana é um fator considerável que tem impacto no nosso planeta. Havia milhões e milhões de pessoas que não acreditavam e que contestavam o impacto da atividade humana no planeta e no clima. Tivemos a demonstração na natureza que a atividade humana tem impacto na saúde do planeta. Por isso é necessário desenvolver o crescimento de uma forma diferente no futuro. Por exemplo, entre muitos outros fatores, é necessário que o financiamento da economia e dos investimentos tenha em conta os imperativos ambientais e climáticos. É é necessário que o mundo da finança se torne mais duradoura. Estes são apenas dois exemplos que ilustram como o modelo de desenvolvimento de amanhã, terá que ser necessariamente diferente, daquele que temos hoje em dia.