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Crise

Empréstimos habitação. "Famílias desfavorecidas devem ter ajuda do Estado"

Um em cada dois agregados em risco de pobreza é proprietário de casa no Luxemburgo. O aumento constante das taxas de juro torna-se um sério problema.

As taxas de juro não param de subir e as famílias mais desfavorecidas podem ter dificuldade em pagar os empréstimos da casa ao banco.

As taxas de juro não param de subir e as famílias mais desfavorecidas podem ter dificuldade em pagar os empréstimos da casa ao banco. © Créditos: Marc Wilwert / Luxemburger Wort

Nem todos os proprietários de casas no Luxemburgo têm elevado poder de compra. “Um em cada dois agregados familiares em risco de pobreza é proprietário” de uma casa no país, diz ao Contacto Michel-Edouard Ruben, economista da Fondation IDEA. Para estas famílias mais desfavorecidas está a tornar-se cada vez mais complicado fazer face ao aumento do custo de vida, a que se tem aliado o aumento constante das taxas de juro, nomeadamente dos empréstimos bancários à habitação.

Esta é uma “questão real”, como diz Michel-Edouard Ruben. As famílias que “estão endividadas, [com empréstimos a] taxas variáveis de juros, correm o risco de poder ter incidentes de pagamento”, diz o especialista. Apesar, de nesta fase, “isso ainda não ser visível nas estatísticas”, o economista lembrou que um relatório recente da Comissão Europeia alerta para este problema.

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De acordo com o documento, “é muito provável, que entre o aumento do serviço da dívida com o aumento das taxas variáveis de juros e o aumento do custo de vida, algumas famílias passem por dificuldades”, diz Michel-Edouard Ruben.

Apoio do Estado

Para ajudar estas famílias com dificuldades nos encargos dos créditos à habitação, o economista da Fondation IDEA propõe uma ajuda concreta do Estado, como foi previsto na crise financeira de 2008.

Trata-se de um apoio à habitação que “seria um adiantamento reembolsável com juros sobre apreciação futura, por exemplo, para os proprietários que não possam reembolsar os seus empréstimos hipotecários contraídos para a compra ou construção das suas casas, devido à perda do poder de compra”, propõe Michel-Edouard Ruben. Um regulamento grão-ducal determinaria as modalidades de concessão deste apoio e as condições do seu reembolso.

As dificuldades que podem passar estas famílias com o aumento dos juros é um dos problemas da atual crise do mercado da habitação no Luxemburgo, indica o economista.

Uma crise derivada também da menor atividade no setor da construção, da falta de habitações acessíveis e da incapacidade de muitos agregados poderem comprar casa, os chamados compradores de primeira viagem.

Falta de habitações

A falta de habitações é um dos grandes problemas do país, visto como um dos fatores que mais afetam a atratividade do Luxemburgo pelos trabalhadores estrangeiros. Atualmente, com a crise no mercado imobiliário a escassez de habitações aumenta. Nos próximos tempos menos casas irão ser construídas. O aumento do custo dos materiais de construção, a subida dos juros e falta de previsibilidade dos preços retraem a construção de novas habitações. Isto para além da diminuição de licenças emitidas. Este ano e no próximo menos casas novas serão construídas, como estimam os especialistas.

“Dado o acentuado declínio no número de licenças emitidas e o número de transações VEFA, é de facto quase certo que o número de casas construídas nos próximos trimestres será inferior ao dos anos anteriores quando o número de casas construídas já era considerado insuficiente”, realça o economista da Fondation Idea. Para o especialista, a solução passa por conseguir “incrementar a oferta de habitação e assim aumentar a procura, sabendo que as necessidades existem de facto”.

Tal como Michel-Edouard Ruben, também Antoine Paccoud, e Julien Licheron, investigadores do Luxembourg Institute of Socio-Economic Research (Liser) alertam que a escassez de habitação no país representa um problema para a atratividade e competitividade do Luxemburgo. E é um dos motivos que levam os residentes e os novos residentes a mudarem-se para as fronteiras dos países vizinhos.

Perante este "período difícil" que se vive o "Estado poderia adquirir habitações dos projetos em dificuldade, e porque não, criar uma empresa pública de construção para acelerar a construção de habitações a preços acessíveis”, diz Antoine Paccoud.

O aumento de habitações a preços acessíveis é também defendido por Julien Licheron como uma das soluções para a escassez de habitação. “Na minha opinião, a solução reside essencialmente no fornecimento de habitação: é essencial construir mais habitação, melhor localizada e com menos espaço. É por isso que os projetos recentemente anunciados, incluindo a tributação de habitações vazias e terrenos não urbanizados parecem-me estar direção certa. Ao mesmo tempo, é essencial apoiar as famílias com rendimentos mais baixos, aumentando o número de unidades habitacionais acessíveis”, indica o investigador da área do imobiliário do Liser.

A situação atual traz à memória a crise vivida em 2008/2009, mas os contornos são distintos, como explica Julien Licheron. “A natureza desta crise é diferente da de 2009. A atual está a resultar num aumento dos preços da construção e, em resposta, numa subida acentuada das taxas de juro, que está a afetar tanto a oferta como a procura de habitação.

Em 2009, tivemos "simplesmente" um problema cíclico de procura, e a queda das taxas de juro ajudou a reanimar a procura num contexto de inflação baixa. Hoje, espera-se que as taxas de juro permaneçam bastante altas em 2023, o que inevitavelmente amortece a procura. Assim, a situação parece-me ser menos fácil de decifrar hoje do que era em 2009”, afirma.