Bernardo Silva, o futuro Bola de Ouro
Dois golos ao Real Madrid indicam o caminho do City para a final da Liga dos Campeões e ainda ao Santo Graal.
© Créditos: AFP
Huuum, estranho. Tem nome de doutor e a verdade é que um doutor da bola: Bernardo Mota Veiga de Carvalho e Silva. Aos 18 anos, é vice-campeão europeu (com um golo na final vs. Sérvia). Aos 19, já marca como gente grande no Benfica B (sete golos) e sagra-se campeão nacional pelo Benfica A, com escassos 11 minutos de utilização na última jornada, vs. FC Porto, no Dragão. Aos 20, é lançado por Leonardo Jardim no Monaco, ao lado de Carvalho e Moutinho. Então, e o Benfica? Nada, zero.
Porquoi? Jesus tem a justificação na ponta da língua. 'Não se olha apenas para a qualidade técnica. Num jogo de 90 minutos, o jogador tem a bola uns três minutos e meio. São 87’ sem bola! É importante valorizar um jogador quando não tem bola. Tecnicamente têm capacidades, mas têm de ajustar esse crescimento, táctico e físico do jogo, para suportarem a qualidade. Não se pode olhar para o menino apenas pela qualidade técnica'. Há quem insista com o argumento de que o presidente Luís Filipe Vieira fala constantemente na aposta da formação e Jesus não o faça convenientemente mas o treinador atalha essa discrepância.
'Apostas é na casa das apostas. Não há apostas nos jogadores, nem sei o que é isso. Os jogadores são formados e desenvolvidos em função do que têm de produzir. Depois, há futebolistas que queimam etapas. Isto não é o meu tempo, em que ficávamos três anos à espera de crescer. Hoje há empresários, que muitas vezes valorizam um produto que não é assim tão bom'. Bom ou não-assim-tão-bom, a verdade é que Bernardo Silva (figura da selecção nacional sub-21, qualificada para o Euro-2015 sem qualquer derrota em dez jogos) cresce gradualmente no Monaco.
A partir de Setembro 2014, o seu futebol encanta. 'Saí do Benfica para jogar mais', diz Bernardo na antevisão de um jogo da fase de grupos na Liga dos Campeões, precisamente na Luz. E o que se passou com Jorge Jesus? “Houve uma conversa com o mister, isso é verdade, mas as coisas que passaram cá para fora não foram exactamente aquilo que aconteceu". Um ano depois, curiosamente, Jesus já está no Sporting e promove Francisco Geraldes do bês à equipa principal. O miúdo, feliz da vida, 'rompe las pelotas'. Ou seja, deslumbra no primeiro treino com os seniores e marca um golo em jogada individual. Jesus critica-o 'deves pensar que és o Maradona'. Geraldes interrompe-o (e cala-o): 'Deves pensar que estás a falar para o Bernardo Silva'.
Pois é, a embirração de Jesus com a malta nova é um problema. Tanto para o treinador como para a malta nova. E porque Bernardo não chega a jogar aquele Benfica vs. Monaco em 2014 (Leonardo Jardim mantém-no o tempo todo no banco de suplentes), a sua estreia na Luz é só em Março 2017, ao serviço da selecção portuguesa.
Por essa altura, Bernardo já é um nome consensual na elite europeia. Primeiro afirma-se e é campeão francês no Monaco em 2016, ao lado de Falcao (capitão), Mbappé. Depois confirma-se na espantosa caminhada da Liga dos Campeões, em que o Monaco chega à ½ final e abalroa o City de Guardiola pela regra dos golos fora (5:3 em Manchester, 3:1 no Monaco). É esse o jogo fatal, por assim dizer. Pep vê-o em acção e deixa-se seduzir pelo seu toque de bola. A sua ambição é levá-lo para Manchester. Meu dito, meu feito. Em Julho 2017, Bernardo é apresentado pelo City e vira ídolo dos adeptos num piscar de olhos.
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O motivo é simples e tem a ver com o toque de bola mais a visão de jogo mais a certeza do passe para a frente. Seja encostado à linha, seja lá à frente, seja a 6, seja como for, Bernardo dá sempre conta do recado com elevada eficácia e muito espectáculo. Porque ele é mesmo assim, até sem querer. Um exemplo flagrante é o 2:1 vs. PSG para a Liga dos Campeões em Fevereiro 2021. O City ganha 2:1, Bernardo assiste Gabriel Jesus para o golo decisivo. Só isso já dá direito a manchete. Só que Bernardo vai mais além e é o primeiro jogador de sempre com uma eficácia 100% de passes em toda a história da competição. Ao todo, 47 passes e zero falhas. Zero. É incrível, é Bernardo.
Agora os dois golos vs. Real Madrid na ½ final da Liga dos Campeões. Um com o pé esquerdo, sem hipótese para Courtois, outro de cabeça, por cima de Alaba, ambos na primeira parte. É mais uma noite de glória, talvez A noite. Bernardo desequilibra por completo a eliminatória e elimina o campeão europeu em título. Para cúmulo, chega aos 100 golos na carreira. Tudo na mesma noite, a mais gloriosa? A pergunta é pertinente, até porque Bernardo já tem uma carreira cheia de sucesso, com golos decisivos até nos dérbis de Manchester e em pleno Old Trafford (0:1 em Novembro 2021).
Só que esta exibição vs. Real Madrid abre os olhos aos mais desatentos e a Bola de Ouro já é um sonho unânime. Se o City levantar a Liga dos Campeões, na final vs. Inter no dia 10 Junho, o de Portugal, o nome de Bernardo é obrigatório para candidato sério à Bola de Ouro. Por qualidade de jogo, respeito pela bola e admiração de todos, sobretudo de Guardiola: 'É dos melhores jogadores que já vi'.
(Autor escreve de acordo com a antiga ortografia.)