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Jeune et jolie: Sem respostas

"Jeune et jolie", de François Ozon, com Marine Vacth, Géraldine Pailhas, Frédéric Pierrot, Fantin Ravat, Charlotte Rampling, Serge Hefeze Johan Leysen.

Não foi nada filha... Agora vai lá prostituir-te, vai!

Não foi nada filha... Agora vai lá prostituir-te, vai!

O último filme do francês François Ozon era dos mais esperados no festival de Cannes de 2013 porque se tratava do primeiro filme gaulês a entrar em competição e, sobretudo, porque o tema central de "Jeune et jolie" seria a prostituição.

Ozon, um dos mais criativos e menos maneiristas cineastas franceses, quase se irritou com os rótulos e foi avisando: "O filme é sobre a adolescência, nada mais".

Ninguém quis ouvir o realizador, sobretudo num país onde a prostituição se tornou num inimigo público e que regularmente discute leis de proibição ou mesmo de penalização dos clientes das prostitutas.O realizador de "Jeune et jolie" tem razão mas também não.

A obra de Ozon segue "as quatro estações" de Isabelle (Marine Vacth), de 17 anos, acompanhadas por outras tantas músicas que ilustram a vida e o estado de espírito da jovem.A história de Isabelle começa com a perda da virgindade com um jovem alemão, que não chega a ser um amor de Verão.

Tudo acontece "porque tem de ser", porque Isabelle assim decidiu. Pouco depois muda a estação e Isabelle começa a prostituir-se.As razões que levam a adolescente a procurar clientes através da internet nunca ficam claras.

O realizador de "Jeune et jolie" insiste que não queria dar respostas ao público: "Os espectadores do meu filme são muito mais inteligentes do que eu; cabe a eles descobrirem porque é que Isabelle se prostitui". Solução fácil, "n'est-ce pas, Monsieur Ozon"?

É verdade que o filme nunca leva pela mão os espectadores. Não os orienta nem lhes cozinha respostas. Talvez essa seja a maior virtude de "Jeune et jolie".

O realizador e argumentista decide deixar em aberto todas as hipóteses e – para isso – eliminou inclusivamente o argumento financeiro: Isabelle é a filha mais velha de um casal de classe média-alta e não precisa de dinheiro para nenhuma das necessidades de uma adolescente da sua idade e do seu meio.

Ozon quis excluir a justificação financeira que seria a resposta fácil aos porquês.Ozon explicou-se: "O dinheiro é sempre importante, mas Isabelle não avança para estes encontros com homens para ganhar dinheiro".

Então é para quê? Trata-se apenas de uma crise da adolescência em que a jovem quer chocar os seus próximos e – sobretudo – os pais? Ou será que esta é a sua forma de avançar nos meandros da sexualidade recém-descoberta?A própria Isabelle não sabe, mas dá-nos pistas.

A jovem diz que uma das coisas de que mais gosta são os primeiros contactos, "falar com eles na internet, e depois por telefone". E continua: "E depois, descobrir o hotel" e por fim a pessoa. Alguns dos seus clientes fazem-lhe lembrar o pai; não admira pois eles têm, em geral, a idade do seu progenitor.

Será esta a freudiana explicação?Ozon continua sem responder. Curiosamente, o cineasta preparou o filme com tal precisão que passou dias a conversar com um psicólogo especialista na adolescência.

Este também não lhe deu respostas únicas. François Ozon estabeleceu uma relação tão próxima com o doutor Serge Hefez que acabou por lhe propor o papel do psicólogo em "Jeune et jolie".

Está claro que o realizador está fascinado pela adolescência e pelas inúmeras dúvidas e desafios que os jovens enfrentam. Ozon assume que descreve esta fase da vida como uma etapa de transformação surpreendente e exprime-o de forma mais gráfica ainda: "Os adolescente são mutantes", disse numa entrevista durante o festival de Cannes.

Na mesma altura, Ozon aproveitou para avisar que o seu filme, não sendo de horror, vai provocar enormes angústias aos pais de jovens. "Jeune et jolie" não se limita a observar o mundo pelos olhos de Isabelle, acrescentando olhares diferentes, como o lado dos pais, por exemplo.

Para eles a angústia vem do facto de ver a sua criança transformar-se, descobrir a vida sexual. Segundo Ozon, esse assunto não é falado nem aparece nos ecrãs de cinema, daí a necessidade de o abordar, mesmo sem dar respostas e pegando nele por um extremo.

"Jeune et jolie", de François Ozon, com Marine Vacth, Géraldine Pailhas, Frédéric Pierrot, Fantin Ravat, Charlotte Rampling, Serge Hefeze Johan Leysen.

Raúl Reis